Mónica Carvalho
Mónica Carvalho
12 Jun, 2020 - 10:23

Contrato de comodato: esclareça todas as dúvidas

Mónica Carvalho

Quer emprestar um bem, mas deseja formalizar esse empréstimo de alguma forma? O contrato de comodato pode ser a solução. Perceba como funciona.

contrato comodato

O contrato de comodato é um elemento fundamental no momento de emprestar um bem, móvel ou imóvel, e querer garantir que esse empréstimo decorra sem imprevistos para ambas as partes e tenha um final feliz. Isto é, que o bem seja restituído ao proprietário nas mesmas condições em que o emprestou.

Na verdade, a maioria das pessoas já se encontrou na posição de emprestar bens mais ou menos valiosos a alguém e, por vezes, esse empréstimo teve um sabor amargo, não sendo o bem restituído sequer ou, em alguns casos, sendo restituído, mas não nas melhores condições.

Dessa forma, para evitar dissabores, o contrato de comodato pode ser um excelente recurso para salvaguardar os direitos e deveres do comodante e do comodatário.

Contrato de comodato: tudo o que precisa de saber

O contrato de comodato é um tipo contrato regulado pelos artigos 1129º e seguintes do Código Civil da Lei Portuguesa.

Neste contrato, o comodante (proprietário) entrega ao comodatário (pessoa que recebe algo a título de empréstimo) um bem, para que se possa servir dele, com a obrigação de o restituir, posteriormente. Traduzindo: trata-se do empréstimo de um bem.

Não é necessário estar sob a forma escrita. Todavia, são muitos os que optam por fazê-lo, no sentido de salvaguardar direitos e obrigações das partes envolvidas.

Assim, pode haver a possibilidade de o comodante estipular certos encargos ao comodatário, as designadas “cláusulas modais”.

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Direitos e deveres

Enquanto que o comodante só responde pelo bem em causa, se tiver responsabilidade sobre o mesmo ou tiver procedido com dolo, o comodatário tem por dever preservar o bem, ou seja, vigiá-lo e evitar a sua subtração ou dano, além de tomar as medidas necessários à sua boa manutenção.

Além disso, o decreto-Lei nº 47344, estipula ainda as obrigações do comodatário, no artigo 1135º:

  • Guardar e conservar o bem emprestado;
  • Facultar ao comodante o exame do bem sempre que necessário ou solicitado;
  • Não aplicar o bem a fim diferente daquele a que se destina;
  • Não usar o bem de forma imprudente;
  • Tolerar quaisquer benfeitorias que o comodante queira realizar no bem ou com ele;
  • Não proporcionar a terceiro o uso do bem, sem autorização expressa do comodante;
  • Avisar imediatamente o comodante sempre que houver algo de errado com o bem;
  • Alertar o comodante sempre que uma terceira parte se arrogue direitos em relação ao bem;
  • Restituir o bem no final do contrato.

Duração do contrato de comodato

De acordo com o artigo 1131º do Código Civil, a duração do contrato de comodato pode ser estabelecida livremente entre as partes envolvidas. Nesse sentido, o fim do contrato pode verificar-se quando o fim para que o bem é emprestado seja atingido.

Ainda assim, o comodante pode resolver o contrato por justa causa. De igual modo, o contrato de comodato pode caducar aquando da morte do comodatário.

Quem usou o bem tem, como vimos, obrigação de o manter nas condições em que o recebeu, estando, contudo, salvaguardadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização.

Enquadramento jurídico-tributário do contrato de comodato

Imposto do selo

Até 2008, o comodato estava sujeito a imposto do selo, desde que o seu valor excedesse os 600€. Contudo, a lei nº 64-A/2008, de 31 de dezembro revogou a anterior verba, pelo que desde 2009, o comodato deixou de estar sujeito a imposto do selo. Assim, não há qualquer obrigação da comunicação deste tipo de contrato à Autoridade Tributária.

IRS e IRC

No que toca ao equipamento cedido através de contrato de comodato, nomeadamente em situações relacionadas com o exercício de atividade empresarial ou profissional, há alguns aspetos a ter em consideração.

Segundo a Associação Portuguesas das Empresas de Contabilidade e Administração (APECA), “sempre que a utilização de máquina, viatura ou equipamento afeto ao exercício de uma atividade se encontre legitimada por título jurídico, através da celebração do contrato de comodato, as despesas relacionadas com a sua manutenção e conservação são consideradas como gasto para efeitos da determinação do lucro tributável,(…)”. Já o mesmo não é considerado no que respeita aos custos inerentes à propriedade do bem, como é o caso das depreciações.

IVA

Também de acordo com a análise da APECA, “o comodato configura uma operação sujeita a IVA à taxa normal, por força do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 4.º do Código do IVA, sempre que o comodante seja sujeito passivo do imposto.”

A Autoridade Tributária também alerta para a existência de “taxa de tributação autónoma aplicável” de acordo com o bem em causa.

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Minuta de contrato de comodato

Caso pretenda saber que informações devem constar neste tipo de contrato, atente:  

  • Identificação dos contraentes (comodante e comodatário), com indicação de nome, nº do cartão do cidadão, estado civil, profissão e morada;
  • Objeto do contrato: o que vai ser emprestado, respetiva descrição e indicação do estado atual;
  • Devolução: estabelecer a responsabilidade do comodatário caso devolva a coisa num estado diferente daquele que lhe foi entregue;
  • Rescisão: quando e por que motivos pode acontecer;
  • Duração: estabelecimento de um prazo ou se haverá lugar a prazo incerto;
  • Condições gerais: todas as demais informações consideradas importantes por ambas as partes;
  • Foro da comarca;
  • Local, data e ano;
  • Nomes e assinaturas dos contraentes e testemunhas.

Exemplo de minuta de contrato de comodato

Contrato de comodato

Identificação do contraente

Comodante: (nome), (nacionalidade), (estado civil), (profissão), Cartão de Cidadão nº (xxx), residente na Rua (xxx), Código-postal (xxx), Cidade (xxx).

Comodatário: (nome), (nacionalidade), (estado civil), (profissão), Cartão de Cidadão nº (xxx), residente na Rua (xxx), Código-postal (xxx), Cidade (xxx).

As partes acima identificadas têm, entre si, justo e acertado o presente Contrato de Comodato de (identificar o bem, móvel ou imóvel), que se regerá pelas cláusulas seguintes e pelas condições descritas no presente.

Objeto do contrato

Cláusula 1ª

O presente contrato tem como objeto, a transferência, pelo comodante ao comodatário, dos direitos de uso e gozo do bem descritos a seguir: (descrever detalhadamente o bem a empréstimo).

Devolução

Cláusula 2ª

O comodatário deverá restituir o bem ao comodante quando for por este solicitado, nas mesmas condições em que estavam quando o recebeu, respondendo pelos danos ou prejuízos causados.

Cláusula 3ª

A devolução deve ocorrer no prazo de (número por extenso) dias após o comodatário ter recebido o aviso, que lhe será enviado através do correio.

Rescisão

Cláusula 4ª

É assegurado às partes a rescisão do presente contrato a qualquer momento, devendo, entretanto, comunicar à outra parte com antecedência mínima de (número por extenso) dias.

Cláusula 5ª

O incumprimento, pelos contratantes, do disposto nas presentes cláusulas também levará a rescisão deste instrumento.

Duração

Cláusula 6ª

Este contrato é de prazo indeterminado.

Ou

Este contrato termina no (dia) (mês) (ano).

Condições gerais

Cláusula 7ª

O presente contrato inicia-se a partir da assinatura pelas partes.

Foro

Cláusula 8ª

Para dirimir quaisquer controvérsias oriundas do contrato, as partes elegem o foro da comarca de (x);

Por estarem assim justos e contratados, firmam o presente instrumento, em duas vias de igual teor, juntamente com 2 (duas) testemunhas.

(Local, data e ano).

(Nome e assinatura do Comodante)

(Nome e assinatura do Comodatário)

(Nome e assinatura da Testemunha 1)

(Nome e assinatura da Testemunha 2)

Para um conhecimento mais aprofundado e, mesmo, científico desta matéria, poderá consultar o artigo de Lourenço Côrte-Real, “Do Contrato de Comodato na Ordem Jurídica Portuguesa: Alguns traços gerais do regime”.

O contrato de comodato é, assim, um mecanismo legal que permite formalizar e oficializar o empréstimo dos mais variados bens, móveis e imóveis, sejam veículos, casas ou outros equipamentos.

Contudo, como em qualquer contrato, é importante que ambas as partes se informem bem sobre aquilo que pretendem, efetivamente, contratualizar e quais as obrigações que desejam estipular a cada um dos contraentes. Só assim é possível garantir uma relação contratual pacífica, que agrade a todos os envolvidos e que garanta um empréstimo benéfico e bem-sucedido, tanto para o comodante, como para o comodatário.

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