Ao princípio, as autoridades e os governos falaram num isolamento de semanas, como se no final desse tempo pudéssemos regressar às nossas vidas habituais, tal como elas eram. Porém, com a implementação das primeiras medidas de desconfinamento, houve algo que ficou claro. Temos que nos preparar mentalmente para a COVID-19 e os tempos de incerteza.
Na verdade, o futuro sempre foi, é e será uma grande incógnita para todos nós. Mas agora, mais do que nunca, somos confrontados de forma fria, brutal e diária com essa circunstância e a única certeza que parece termos é de que a pandemia veio para ficar e podemos ter meses ou mesmos anos desta “espécie de normalidade”.
COVID-19 e os tempos de incerteza: sobreviver à ansiedade
Na semana passada, Chris Whitty, chief medical adviser (espécie de conselheiro médico) do Reino Unido, declarou que o distanciamento social tem de continuar, pelo menos, durante todo o presente ano de 2020. Já os canadianos, foram informados de que haverá limites nas viagens e ajuntamentos durante cerca de 1 ano e meio. Até Donald Trump admitiu recentemente que estas medidas de contenção, associadas à pandemia, podem continuar ao longo de todo o verão e mesmo para além dele.
Algumas regiões têm considerado abrir, gradualmente, as suas economias, seguindo o exemplo de alguns países asiáticos que, assim, conseguiram controlar o número de novas infeções. Porém, dezenas de especialistas afirmam que tal só é possível com muitas cautelas e que é impossível (ou altamente desaconselhável) voltarmos muito rapidamente às nossas vidas, como as conhecíamos.
Mas, afinal, como nos devemos comportar?
Agora que já não estamos no início da pandemia, mas numa espécie de “interminável meio”, e algumas medidas de restrição começam a ser levantadas, todos nos perguntamos acerca de como, afinal, nos devemos comportar, uma vez que já não estamos completamente confinados, mas o perigo ainda não desapareceu. E a COVID-19 e os tempos de incerteza estão aí.
Amelia Aldao, psicóloga especializada em ansiedade, aconselha a que todos reajustem os seus horizontes e objetivos de vida. Segundo a especialista, se todos continuarmos a alimentar a esperança no concerto agendado para julho ou no casamento marcado para setembro, podemos entrar num estado de grande ansiedade ou incerteza que se pode tornar problemático.
Ter planos é psicologicamente benéfico, pois mantém-nos entusiasmados e motivados em relação à vida. Contudo, neste momento, focarmo-nos no presente, no agora, nos próximos dias ou semanas, será o mais sensato, tendo em conta as circunstâncias.
Amelia Aldao recomenda que se siga aquele que é conhecido como o paradoxo de Stockdale: “esperar o melhor, preparando-se para o pior”. Assim, não podemos atravessar toda esta pandemia na expectativa de que a “normalidade” chegue a qualquer momento, pois isso só nos vai trazer sofrimento.
E como lidar com esse confronto com a realidade?
A par do cancelamento ou adiamento de muitos dos nossos projetos, é importante, segundo a psicóloga e investigadora Tasha Eurich, começar a fazer outros planos. Contraditório? Nós explicamos.
De acordo com esta psicóloga, não conseguimos controlar o incontrolável, mas podemos criar o nosso próprio “plano de contingência”. Ou seja, sabendo que até existir uma vacina, será necessário perpetuar um certo isolamento, além de meras semanas, como é que podemos criar um plano que torne esta nova realidade segura, aceitável, agradável e “normal”?
A resposta está nesse tal plano ou planos individuais e coletivos, que tenham em conta circunstâncias tangíveis e objetivas que possam acontecer, mesmo que nem todas sejam agradáveis. A ideia não é ficar preso a pensamentos negativos, mas criar “planos B” para eles. Por exemplo, o que fazer se eu ou alguém adoecer; se o meu negócio não puder reabrir;… entre outros cenários.
Outro exercício que Tasha Eurich propõe é que nos imaginemos, daqui a alguns anos, com os nossos netos, e pensemos sobre como lhes responderíamos se eles nos perguntassem como foi viver esta pandemia. Isso ajuda a perceber aquilo em que nos queremos realmente focar no presente.
Para ela, mais do que ter esperança no futuro, é preciso ter gratidão em relação ao presente e, cada um, “agarrar-se” àquilo que tem de positivo na sua vida, seja família, saúde, trabalho, amor ou amizade.
Dicas gerais para lidar melhor com estes tempos de incerteza
- Mantenha-se informado, mas não obsessivamente: privilegie as fontes oficiais e modere o consumo de notícias;
- Concentre-se naquilo que consegue controlar: num momento em que sentimos que tudo foge ao nosso controlo, há coisas que ainda podemos dominar como, por exemplo, adotar e pôr em prática as medidas de contenção e prevenção de contágio emitidas pelas autoridades competentes;
- Faça o seu “plano de contingência”: para se sentir mais seguro e que consegue prever e controlar situações futuras, crie planos A, B, C,… Eles vão confortá-lo e dar-lhe uma maior sensação de confiança;
- Esteja online: nesta altura, estar online pode ser uma excelente forma de manter contacto com quem gosta, mas está fisicamente longe. Porém, deve selecionar apenas os contactos positivos e que o fazem sentir-se bem;
- Trate do seu corpo e mente: pratique rotinas saudáveis, alimente-se corretamente, exercite-se e mime-se com aquilo de que mais gosta e lhe faz bem;
- Ajude os outros: se puder fazer voluntariado nesta altura, tal pode ser muito benéfico para os outros e para si também. Essa solidariedade pode passar por dar apoio a um vizinho, ligar a um amigo que está mais sozinho ou entregar compras a quem esteja mais isolado.