O direito ao voto é considerado, por muitos, um dos símbolos máximos da democracia.
É através dele que os cidadãos podem expressar as suas convicções e eleger os programas e protagonistas que os governam. Por outras palavras, é dos instrumentos mais efetivos para fazer cumprir a vontade do povo no caso de as eleições serem livres e participadas.
Apesar de ser considerado um direito que deve assistir a todos os cidadãos, há diferenças no tempo e no espaço que não são negligenciáveis.
Se, por um lado, o voto não existiu sempre e, quando foi criado, estava longe de ser como é hoje, por outro, há grandes diferenças entre várias geografias do globo, com exemplos de grandes limitações à liberdade, universalidade e eficácia do mesmo.
Direito ao voto: tipos de sufrágio
Sufrágio restrito
No sufrágio restrito existem restrições de índole económica, cognitiva, intelectual, social, cultural, racial ou de género. Quer isto dizer que indvíduos que não observem determinados requisitos numa ou em várias destas áreas estão impedidos de votar.
Sufrágio universal
Neste tipo de sufrágio, as restrições são mínimas, estando relacionadas com a idade ou a nacionalidade dos cidadãos. Com efeito, só cidadãos maiores de idade ou cidadãos nacionais, podendo incluir-se cidadãos estrangeiros com residência no país e que preencham outros requisitos, podem votar.
Sufrágio igual
Ocorre quando todos os cidadãos eleitores podem participar livremente na eleição, tendo cada um a mesma preponderância. Por outras palavras, a cada cidadão corresponde um voto.
Sufrágio plural
O sufrágio plural dá-se quando um cidadão pode votar em mais do que um círculo eleitoral ou acumular votos num mesmo círculo eleitoral. Desta forma, há cidadãos que podem ter mais votos do que outros.
Sufrágio direto
Caracteriza-se por permitir que os eleitores votem diretamente nos seus representantes sem a existência de intermediários. O processo pode caracterizar-se pela existência de várias listas com candidatos, sendo que cada cidadão vota numa delas. Posteriormente, os membros das listas serão ou não eleitos consoante o número de votos que cada uma recolher.
Sufrágio indireto
Neste caso, os eleitores elegem delegados ou um colégio eleitoral de onde depois sairá a escolha dos representantes do povo. Neste caso, as pessoas não têm oportunidade de escolher diretamente quem são os seus representantes. É o caso dos Estados Unidos da América, onde o Presidente e o Vice-Presidente são escolhidos por um colégio eleitoral que resulta de sufrágio universal.
Direito ao voto: contexto histórico
Muitos veiculam que o surgimento do voto se deu na Grécia antiga no século V a. C., onde apenas cerca de um quinto da população podia votar. Porém, alguns historiadores afirmam que o voto pode ter surgido ainda antes, com base em relatos da escolha de líderes celtas ou hindus através de votação entre druídas ou sacerdotes.
Durante a idade média não houve grandes evoluções no processo eleitoral, uma vez que os sufrágios continuavam a ser restritos, como é exemplo o caso do Feudalismo na Inglaterra. Muitas monarquias na Europa eram absolutistas, significando que o poder se encontrava concentrado no Rei, não havendo espaço para a manifestação da vontade dos cidadãos.
É com a revolução ocorrida neste país durante o século XVII e, mais tarde, com a Revolução Francesa, que a ideia de alargar a participação nas eleições a grupos de cidadãos de classes inferiores começa a ganhar mais força, contribuindo para a consolidação do sufrágio universal, ideia que se foi transmitindo a outros países.
Em França, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão estipulou a igualdade civil entre todos os homens em 1789 e, em 1848, o governo desse país decretou o novo princípio eleitoral que definia um sufrágio universal direto, estabelecendo o valor igual dos votos num sistema de proporcionalidade da representação. Esta decisão não foi vista com agrado por muitos intelectuais europeus, que suspeitavam da capacidade das massas embrutecidas pelo árduo trabalho para decidir, bem como levantavam dúvidas ao próprio sistema representativo em si.
No entanto, inicialmente o voto era apenas concedido a cidadãos masculinos e, nalguns casos, com impedimentos raciais. O primeiro país a permitir que as mulheres, bem como todas as etnias pudessem votar, ou seja, realizando um sufrágio verdadeiramente universal, foi a Nova Zelândia em 1893.
De resto, a causa do voto feminino é um movimento à escala global, com origem no século XIX no Reino Unido, através da criação da União Nacional para o Sufrágio Feminino, por Millicent Fawcet. Inicialmente pacífico, o movimento pelo voto feminino foi-se tornando mais veemente. As sufragistas – como eram conhecidas as mulheres que lutaram pelo direito de voto feminino – foram realizando cada vez mais manifestações que culminaram, por exemplo, na morte de Emily Davison, que se atirou para a frente do cavalo do Rei George V, em 1913.
Só muito recentemente, em 2015, a Arábia Saudita, um dos países mais conservadores do mundo, concedeu direito de voto às mulheres.
Direito ao voto: o caso português
As primeiras eleições em Portugal deram-se entre 10 e 27 de dezembro de 1820 para as Cortes Constituintes de 1820, aquele que alguns designam como primeiro parlamento português no seu significado moderno.
O método de eleição foi baseado na Constituição de Cádis de 1812 e consistiu num sufrágio indireto, através de juntas eleitorais de paróquia, comarca ou província. Cidadãos masculinos, com mais de 25 anos e que exercessem ocupação considerada útil votavam para eleger os grandes eleitores que, por sua vez, escolhiam os eleitores de comarca. Era destes que saía a escolha dos deputados às cortes constituintes.
Foi em 1911 que votou a primeira mulher em Portugal, mas não por ser permitido que as mulheres votassem. A lei referia que o direito de votar pertencia aos cidadãos portugueses com mais de 21 anos que soubessem ler e escrever e fossem chefes de família. Carolina Beatriz Ângelo aproveitou esta redação para reivindicar o seu direito de votar. Uma vez que o plural do masculino “cidadãos eleitores” pode englobar os dois géneros e uma vez que era instruída, viúva com uma filha menor a cargo – chefe de família, portanto – e tinha mais de 21 anos, Carolina Beatriz Ângelo requereu o direito de votar ao Presidente da Comissão Recenseadora do 2º Bairro de Lisboa que indeferiu a sua pretensão.
No entanto, após recurso em tribunal, o juiz João Baptista Castro deu razão a Carolina, afirmando que excluir a mulher de votar só por ser mulher estava contra os ideais de democracia e justiça. Desta forma, a 28 de maio de 1911, Carolina Beatriz Ângelo votou para a Assembleia Constituinte.
Durante o Estado Novo, os cidadãos maiores de 21 ou emancipados eram os que podiam votar. As mulheres poderiam exercer esse direito se fossem chefes de família e possuidoras de habilitação secundária ou acima. Por sua vez, cidadãos analfabetos só poderiam votar se pagassem impostos em montante superior a 100 escudos.
Foi só a partir da revolução do 25 de abril de 1974 que as eleições se passaram a realizar por sufrágio universal nos moldes que hoje conhecemos.
Na atualidade, os cidadãos com idade superior a 18 anos estão automaticamente recenseados, podendo votar no círculo onde estão inscritos. Cidadãos estrangeiros que residam em Portugal podem também votar, desde que inscritos e sejam oriundos dos Estados Membros da União Europeia ou de um dos seguintes países: Argentina, Brasil, Cabo Verde, Chile, Colômbia, Islândia, Noruega, Nova Zelândia, Peru, Uruguai e Venezuela.
Artigo originalmente publicado em outubro de 2017. Última atualização em abril de 2024.