O direito à greve é um direito irrenunciável, que é garantido pela Constituição da República Portuguesa (CRP). Com efeito, o art. 57º da CRP depois de consagrar o direito à greve (nº 1), determina que compete aos trabalhadores definir o âmbito de interesses a defender através da greve, salientando que a lei não pode limitar esse âmbito (nº 2). A greve, enquanto instrumento para reivindicar a melhoria das condições de trabalho e de salário dos trabalhadores, bem como a salvaguarda de direitos e garantias, constitui um importante elemento de pressão junto do empregador, designadamente no âmbito da negociação colectiva.
Competindo aos trabalhadores definir o âmbito de interesses a defender através da greve, o que resulta igualmente do nº 2 do art. 530º do Código do Trabalho (Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro), são, contudo, as associações sindicais que detêm a prerrogativa de declarar a greve. A lei é clara ao determinar que o recurso à greve é decidido pelas associações sindicais, admitindo, não obstante, que numa empresa a respectiva assembleia de trabalhadores possa deliberar o recurso à greve, mas para que tal aconteça é necessário que (i) a maioria dos trabalhadores não esteja representada por associações sindicais; (ii) a assembleia seja convocada para o efeito por 20 % ou 200 trabalhadores; (iii) que a maioria dos trabalhadores participe na votação; (iv) e que a deliberação seja aprovada por voto secreto pela maioria dos votantes (art. 531º, nºs 1 e 2, do Código do Trabalho).
Exercício do direito à greve
O recurso à greve é um instrumento de extrema eficácia pela pressão que exerce junto do empregador e, neste sentido, é o epicentro da conflitualidade laboral. O clima de conflitualidade presente, assim como a necessidade de impedir acções extremadas e prejuízos desmesurados e desproporcionais impõem o exercício regulado e limitado da greve.
Quem representa os trabalhadores em greve?
Os trabalhadores são representados por aqueles que detém o poder de declarar a greve, ou seja, pela associação ou associações sindicais que decidiram o recurso à greve ou, no caso em que esta seja declarada por uma assembleia de trabalhadores, pela comissão de greve eleita para o efeito pela referida assembleia (art. 532º, nº 1, do Código do Trabalho). A lei admite ainda a possibilidade de os poderes de representação poderem ser delegados (art. 532º, nº 2, do Código de Trabalho).
Efeitos da greve e ponderação de interesses
A greve suspende o contrato de trabalho do trabalhador em greve, incluindo o direito à retribuição e os deveres de subordinação e assiduidade (art. 536º, nº 1, do Código do Trabalho). O efeito de paralisação da prestação do trabalho não prejudica, no entanto, os direitos, deveres e garantias das partes que não pressuponham a efectiva prestação do trabalho, bem como os direitos previstos em legislação de segurança social e as prestações devidas por acidente de trabalho ou doença profissional (art. 536º, nº 2, do Código do Trabalho). O período de suspensão também não afecta a antiguidade do trabalhador (art. 536º, nº 3, do Código do Trabalho).
É curioso notar que o legislador optou por não apresentar uma definição de greve, o que se compreende porque, se o fizesse, acabaria por restringir inevitavelmente o exercício do direito à greve a um conjunto de condutas específicas e, consequentemente, limitadoras do mesmo. Mas isto não significa que o direito à greve seja um direito ilimitado, ou seja, que possa ocorrer em toda e qualquer situação sem obedecer a um conjunto de regras. As regras existem e visam a defesa de outros tantos direitos que igualmente cumpre respeitar e acautelar, sob pena de a greve ser considerada ilícita.
À semelhança do que acontece com o exercício de qualquer direito, também o direito à greve deve ser exercido dentro dos limites da legalidade, devendo pautar-se pelos princípios da boa-fé, da proporcionalidade e da adequação, não podendo, por isso, configurar uma situação de abuso de direito, na medida em que o fim que se procura atingir ou os direitos que se pretendem salvaguardar com o recurso à greve, não podem causar danos ou prejuízos desproporcionais na esfera do empregador. Desde logo, o fim que se pretende atingir não pode ser obviamente ilícito, nem o recurso à greve pode ser ditado por razões alheias ao legítimo exercício da salvaguarda de interesses e direitos laborais.
O que se pretende é o exercício legítimo do direito à greve, que decorre da necessária ponderação entre os ganhos obtidos por parte dos trabalhadores e os prejuízos causados na esfera do empregador, sem descurar aqueles que venham a ser afectados pela greve. Claro que, dado o clima de conflitualidade que caracteriza o fenómeno da greve, o equilíbrio desejado nem sempre é fácil de alcançar e o extremar de posições pode obrigar a recorrer aos tribunais – veja-se a recente polémica em torno da greve dos enfermeiros.
Aviso prévio e serviços a assegurar durante a greve
A lei estipula que a entidade que decida o recurso à greve deve cumprir o aviso prévio de greve, que deve ser dirigido ao empregador, ou à associação de empregadores, bem como ao ministério responsável pela área laboral, com a antecedência mínima de cinco dias úteis ou, quando se trate de uma empresa ou estabelecimento que se destine à satisfação de necessidades sociais impreteríveis, dez dias úteis (art. 534º, nº 1, do Código do Trabalho).
Na ponderação entre os interesses e direitos dos trabalhadores e a salvaguarda de outros direitos igualmente legítimos – do empregador e da empresa ou de terceiros que venham a ser afectados pela greve –, a lei impõe a obrigação de prestação de serviços durante a greve. Esta obrigação encontra-se prevista no art. 537º do Código do Trabalho, procedendo-se no artigo seguinte à definição dos serviços a assegurar durante a greve.
O art. 537º do Código do Trabalho impõe precisamente às associações sindicais, ou à comissão de greve, e aos trabalhadores a prestação de serviços mínimos indispensáveis à satisfação das necessidades sociais impreteríveis – quando se trate de empresa ou estabelecimento que se destine à satisfação dessas necessidades – (nº 1), bem como a realização dos serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações da empresa ou estabelecimento (nº 3).
Em qualquer dos casos, os trabalhadores que, durante a greve, prestem serviços, mantêm-se, na estrita medida necessária a essa prestação, sob a autoridade e direcção do empregador, tendo nomeadamente direito a retribuição (art. 537º, nº 4, do Código do Trabalho).
A informação contida nesta rubrica é prestada de forma geral e abstracta, tratando-se assim de textos meramente informativos, pelo que não constitui nem dispensa a assistência profissional qualificada, não podendo servir de base para qualquer tomada de decisão sem a referida assistência profissional qualificada e dirigida ao caso concreto.