Se uma empresa não deu formação está a colocar em causa os direitos dos seus recursos humanos, mas sobretudo está a desrespeitar a lei laboral em vigor.
A formação profissional contínua nas empresas é parte integrante de qualquer contrato de trabalho. Além disso, apresenta vantagens para empresas e trabalhadores: estimula o desenvolvimento dos colaboradores, reduz a rotatividade e estimula a produtividade.
Saiba o que está em causa se a sua empresa não deu formação no ano que passou.
Formação em contexto de trabalho: o que diz a lei?
A formação é obrigatória
O Código do Trabalho prevê a obrigação de qualquer entidade empregadora proporcionar formação contínua aos seus trabalhadores, “através de um número mínimo anual de horas de formação, mediante ações desenvolvidas na empresa ou a concessão de tempo para frequência de formação por iniciativa do trabalhador”.
Assim, cada colaborador tem direito a um número mínimo de quarenta horas de formação contínua por ano. Caso seja contratado a termo por período igual ou superior a três meses, tem direito a um número mínimo de horas proporcional à duração do contrato em cada ano.
Por sua vez, o empregador deve assegurar, em cada ano, formação contínua a pelo menos 10% dos trabalhadores da empresa e não, necessariamente, em simultâneo a todos os elementos.
Portanto, se no ano que passou a sua empresa não deu formação, saiba que está em incumprimento.
Por quem deve ser dada a formação?
A formação contínua prevista na lei laboral pode ser desenvolvida pela própria entidade empregadora, por entidade formadora certificada para o efeito ou por estabelecimento de ensino reconhecido pelo ministério competente e dá lugar à emissão de certificado e a registo na Caderneta Individual de Competências nos termos do regime jurídico do Sistema Nacional de Qualificações. A escolha da formação a realizar pode, pois, partir da iniciativa de cada trabalhador, de acordo com as suas preferências, relacionadas com as funções que desempenha.
Qualquer conteúdo pode ser considerado na formação contínua?
O tipo ou o formato do conteúdo apresentado nas ações de formação contínua deve ser determinado por acordo entre os trabalhadores e o empregador. Porém, o principal foco de qualquer ação de formação contínua deve estar em temas relacionados diretamente com a atividade de cada trabalhador.
Podem, ainda, ser ministradas formações sobre matérias mais abrangentes, como tecnologias de informação e comunicação, saúde e segurança no trabalho e línguas estrangeiras.
Os trabalhadores são obrigados a frequentar formação oferecida pela empresa?
De acordo com os deveres previstos no artigo 128º do Código de Trabalho, os trabalhadores têm a obrigação de participar nas ações de formação profissional proporcionadas pela entidade empregadora.
Ou seja, não apenas a empresa é obrigada legalmente a garantir a formação contínua dos seus trabalhadores, como os trabalhadores são obrigados a frequentá-la.
As horas de formação podem ser descontadas no salário?
As horas obrigatórias de formação estão previstas na lei, portanto, são consideradas como períodos normais de trabalho. Não podem, portanto, ser descontadas.
As ações podem ocorrer fora do horário laboral?
A formação profissional obrigatória pode ocorrer fora do período laboral ou em dias de folga dos colaboradores. No entanto, caso tal aconteça, o trabalhador deve ser compensado.
Caso a formação não exceda duas horas de trabalho, essas são pagas pelo valor normal. Já se ultrapassar esse tempo, cada hora deve ser paga como extraordinária, de acordo com as regras do trabalho suplementar.
E quando a empresa não deu formação?
Se o ano terminou e a empresa não deu formação, há direitos que o trabalhador pode exigir. Quais?
Direitos dos trabalhadores
A formação contínua é obrigatória e se não for ministrada é convertida em créditos de formação. Se ao fim de dois anos, se mantiver, cada trabalhador pode usar esse mesmo crédito em ações de formação externa.
Para o fazer, basta que comuniquem a sua intenção por escrito ao seu empregador, com a antecedência mínima de 10 dias.
E em caso de rescisão de contrato de trabalho?
Se o trabalhador rescindir o contrato antes de utilizar o crédito, terá direito a receber uma compensação em dinheiro pelas horas de formação em falta.
Um trabalhador-estudante pode usar as horas de formação em aulas ou exames?
O artigo 131º do Código de Trabalho prevê que as 40 horas de formação profissional contínua possam ser usadas no regime de trabalhador-estudante para a frequência de aulas, quando o colaborador for dispensado do trabalho, de modo a substituir os períodos de faltas para fazer provas de avaliação. Ou seja, estas horas de formação são aplicadas nos períodos em que falta ao trabalho, com a justificação de estar a terminar os seus estudos.
O tempo de formação obrigatória pode, ainda, ser usado para processos de reconhecimento, validação e certificação de competências.
Há coimas para quem não cumpre
Se uma empresa não deu formação contínua aos seus trabalhadores, sendo essa uma obrigação prevista na lei laboral, sujeita-se a ter de pagar multa.
A entidade fiscalizadora responsável por este matéria é a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), a qual pode, em caso de incumprimento, aplicar coimas cujo valor varia de acordo com o volume de negócios da empresa e do grau da culpa do infrator, como disposto no artigo 554º do CT.