Share the post "Falsas memórias: as nossas lembranças são reais ou ilusões?"
Embora a nossa memória aparente ser uma soma sólida e direta daquilo que somos, há fortes evidências que sugerem que as memórias são extremamente complexas, sujeitas a mudança e nem sempre confiáveis. Reconstruímos as memórias à medida que envelhecemos e a nossa visão acerca do mundo muda. Recordamos falsamente eventos da infância e, através de sugestões efetivas, podemos até criar novas falsas memórias.
Podemos ser induzidos a recordar eventos que nunca aconteceram ou mudar os detalhes daquilo que realmente aconteceu. Podemos receber informações falsas e ficar convencidos que determinado evento aconteceu, mesmo que não nos lembremos dele.
Mas se as memórias podem ser genuínas, falsas ou uma combinação das duas, de que forma podemos saber se aquilo de que nos lembramos é real ou ilusão?
Memória e falsas memórias
Podemos definir a memória como a forma através da qual codificamos, armazenamos e recuperamos as informações passadas para que as possamos utilizar no presente. Contudo, determinadas lembranças recuperadas podem ser feitas à custa de erros ou distorções, e nesses casos estamos perante falsas memórias.
Falsas memórias são lembranças de eventos que nunca ocorreram na realidade ou recordação de um evento de uma maneira muito diferente da forma como este realmente decorreu. São uma falha da memória, uma ilusão, que certamente já nos aconteceu a todos.
Imaginemos este cenário: estou em casa doente, a descansar no sofá e lembro-me que está na hora da toma do antibiótico. Para o fazer, basta que me levante, vá à cozinha, tire um copo do armário, abra a torneira, encha o copo e tome o comprimido. No entanto, não me levanto e em vez disso imagino apenas esta sequência de passos. No entretanto, alguém conversa comigo, distraio-me e mais tarde, pergunto-me se terei tomado o antibiótico ou se apenas imaginei.
Como se criam as falsas memórias
As falsas memórias podem surgir de duas formas: de forma espontânea ou de forma implantada ou sugerida. As falsas memórias espontâneas são criadas internamente resultam de distorções do próprio funcionamento da memória, livre de interferência de fontes externas.
Já as falsas memórias sugeridas ou implantadas são aquelas relacionadas com o resultado de uma sugestão externa, independentemente de ser propositadamente ou não.
Quais as implicações das falsas memórias?
As falsas memórias podem ter implicações significativas nas situações em que a recuperação de memórias seja crítica, como no caso de testemunho ocular de um crime.
A situação típica de julgamento conduz frequentemente a distorções, dado que geralmente ocorre longos períodos após o episódio em questão, apela à recapitulação repetida do evento e recorre à utilização de questões traiçoeiras durante o interrogatório, entre outros aspetos.
A memória dos eventos nestas circunstâncias está fortemente vulnerável. O testemunho de crianças é também particularmente sensível à formação de distorções de memória.
A investigação acerca da memória humana e acerca da criação de falsas memórias é fascinante e é importante que se desenvolva cada vez mais, de forma a acautelar alguns erros e riscos, não só na situação de julgamento, mas também no âmbito de algumas práticas terapêuticas, tais como a recuperação sugestão de memórias de infância, a hipnose, a imaginação guiada ou as sessões de recordação em grupo.