Share the post "Finanças comportamentais: a teoria das emoções nos investimentos"
Há várias décadas que os especialistas perceberam que os mercados financeiros não podem ser considerados como completamente racionais e imparciais – mas só recentemente o tema das finanças comportamentais ganhou popularidade à escala global.
O conceito, que alia a teoria financeira a princípios da psicologia e da neurologia, muda as regras do jogo quando o tema é investimento.
O que são as finanças comportamentais?
As finanças comportamentais são uma linha teórica da área das finanças que defende que os investidores não são tão racionais e imparciais como fazem crer as teorias financeiras clássicas. Pelo contrário, os investidores são humanos e, como tal, vulneráveis e estados emocionais e psicológicos, perspetivas distorcidas da realidade ou simples iliteracia financeira.
O grande objetivo das finanças pessoais é, por isso, adaptar as estratégias e os modelos financeiros preditivos a um contexto em que há, do lado dos investidores, uma certa imprevisibilidade (que pode, ainda assim, ser manipulada e influenciada). Essa imprevisibilidade afeta as decisões que os investidores tomam mas, em consequência, também afetam o comportamento global dos mercados financeiros.
Na literatura, as finanças pessoais têm surgido associadas a outros temas, como “nudge” – a “teoria do empurrão” que serve de base (e de título) a um livro do economista galardoado Richard Thaler.
Que (d)efeitos são avaliados pelas finanças comportamentais?
É quase infinita a lista de vieses psicológicos abordados pelas finanças comportamentais, mas há um conjunto que pode ser considerado basilar. Este conjunto de (d)efeitos psicológicos é apontado pelos teóricos da área como altamente decisivo no momento de um investidor tomar uma decisão.
Aversão à perda
As finanças comportamentais defendem que todos nós, enquanto investidores, sentimos sempre muito mais as perdas do que os ganhos. Num exemplo prático, é o mesmo que dizer que é maior a deceção de perdermos 10 euros do que a alegria de ganhar os mesmos 10 euros.
Este viés psicológico, dizem os especialistas, faz com que tenhamos muito maior predisposição para evitar investimentos a longo prazo se eles implicarem o risco de perdas a curto prazo – porque, lá está, custa mais perder hoje 10 euros do que ganhar 20 amanhã.
Efeito disposição
Este efeito surge muitas vezes associado à aversão à perda e reflete-se na nossa tendência de precipitar os ganhos e adiar as perdas – porque, mais uma vez, é mais satisfatório ganhar já do que depois, e igualmente atraente “empurrar com a barriga” as perdas em vez de assumi-las de uma vez.
Em contexto de investimentos, este viés traduz-se numa tendência natural dos investidores para venderem precocemente títulos que estão a valorizar (perdendo os ganhos potenciais do futuro) e, simultaneamente, conservarem títulos que estão a desvalorizar (acabando por perder mais a longo prazo do que se tivessem resolvido o assunto mais cedo).
Excesso de confiança
Este viés é praticamente autoexplicativo e afeta, sobretudo os investidores com um pouco mais de literacia financeira. Confiantes de que sabem o que é preciso saber e de que as informações de que dispõem são credíveis e infalíveis, estes investidores tendem a sobrestimar a probabilidade de sucesso e a subestimar o risco, precipitando-se para decisões pouco ponderadas e desnecessariamente arriscadas.
Iliteracia financeira
A tomada de decisões impulsivas também acontece no mercado financeiro. Neste caso, as finanças comportamentais explicam que a confiança em informações desatualizadas ou erradas – ou a simples falta de interesse no tema – podem levar os investidores a deixar-se levar pelas emoções.
O resultado, nesta situação, é uma carteira de investimentos com o risco mal calculado, pouco diversificada ou sem objetivos concretos definidos.
Confirmação
O viés da confirmação diz que todos nós – na vida financeira como na pessoal – tendemos a valorizar mais as informações que corroboram aquilo em que já acreditamos do que aquelas que nos dizem algo de diferente.
Quando o tema é investimento, as finanças comportamentais defendem que os investidores tendem a tomar decisões com base em informações que corroboram as suas próprias crenças – mesmo que essas crenças (e respetivas confirmações) estejam erradas ou venham de fontes não fidedignas.
Efeito “manada”
Este viés é mais visível no dia a dia e as finanças comportamentais estão atentas a ele. De acordo com esta teoria, em períodos de maior incerteza tendemos sempre a seguir – ainda que de forma irracional – as ações da maioria, mesmo quando a maioria está a tomar atitudes erradas.
Exemplos práticos deste viés são fáceis de encontrar, e um deles bem recente: a corrida ao papel higiénico no início da pandemia, mesmo depois de vendedores e fornecedores terem garantido que o produto não ia sofrer escassez, foi um comportamento clássico de efeito “manada”. Aplicado aos investimentos, pode resultar em “crash” nas bolsas quando todos os investidores resolvem vender desesperadamente (e infundadamente) os títulos ao mesmo tempo.
Sobrevalorização do presente
Regressamos à preferência pela recompensa imediata, mesmo que seja menor do que a do futuro. Este viés é observado pelas finanças comportamentais nos investimentos (quando os investidores preferem períodos curtos e de menor rendimento em detrimento de períodos longos de maior retorno), mas também nas poupanças: a nossa dificuldade em projetar o futuro e as necessidades que nele podem surgir faz com que seja difícil abdicar da recompensa presente.
Perceção irracional de riqueza
Ser-se rico não é só ter muito dinheiro no banco – há muitas formas de enriquecer e muitos tipos de riqueza. No entanto, as finanças comportamentais acreditam que todos nós ficamos mais deslumbrados com o valor nominal do que com qualquer outra expressão de riqueza.
Em termos práticos, significa que este viés nos leva a acreditar que o que temos vale mais do que aquilo que realmente vale, considerando a evolução dos mercados, a desvalorização e a inflação. Esta perceção pode levar-nos a conservar ativos pouco ou nada rentáveis, desperdiçando outras oportunidades melhores de investimento.
Como controlar o viés emocional?
Desengane-se se pensa que só o investidor amador sofre com estes vieses. As finanças comportamentais assumem, desde o primeiro momento, que todos os investidores – até os profissionais – são afetados pelos vieses emocionais e psicológicos.
Claro que ter consciência destas fragilidades é um importante passo para combatê-las, mas, ainda assim, os especialistas acreditam que é impossível ser-se milimetricamente imparcial e desprovido de emoções – a menos que sejamos robôs.
Assim, a sugestão dos teóricos das finanças comportamentais passa por diversificar a tomada de decisão, envolvendo mais do que uma pessoa no processo. Mesmo que as duas (ou mais) pessoas tenham vieses, em princípio terão vieses diferentes ou, pelo menos, serão afetadas por eles de forma diferente.
Esta diferença na experiência do viés emocional ajuda a que todos os elementos envolvidos na decisão consigam equilibrar-se melhor, detetando e combatendo as fragilidades uns dos outros.