Marta Maia
Marta Maia
19 Mai, 2021 - 12:03

Fundos sustentáveis ou ESG: entender a nova tendência de investimento

Marta Maia

Compreenda como funcionam os fundos sustentáveis ou fundos ESG e como pode começar a investir para fazer do mundo um lugar melhor.

Fundos sustentáveis

O aumento das preocupações sociais e ambientais ao longo dos últimos anos tem-se refletido no mundo dos negócios. Um pouco por todo o mundo – mas numa tendência liderada pela Europa e seguida, muito de perto, pelos Estados Unidos – surgem os fundos sustentáveis: fundos de investimento que consideram bem mais do que a rentabilidade financeira.

Embora mais pequeno, o mercado português também já dispõe de algumas ofertas de fundos sustentáveis. Percorremos as opções disponíveis e analisamos as diferentes abordagens possíveis para quem está a começar nesta nova área.

O que são fundos sustentáveis ou fundos ESG?

Os fundos sustentáveis são fundos de investimento que consideram o desempenho ambiental, social e de governo societário das empresas para além das métricas financeiras tradicionais.

De uma forma geral, têm por objetivo combater o tradicional conflito entre o bem-estar social, a proteção ambiental e a necessidade de retorno financeiro de quem investe.

A sigla ESG

Os fundos sustentáveis são identificados no mercado internacional com a sigla ESG. Esta sigla corresponde à denominação em inglês Enviromental, Social and Governance, que se refere a uma tríade de características dos investimentos:

  • Preservação ambiental (Environmental): cuidados relacionados com a conservação da natureza e do meio ambiente ao longo de toda a cadeia de valor;
  • Sustentabilidade social (Social): construção de uma relação sustentável entre a atividade empresarial e as pessoas da comunidade em que ela se insere;
  • Governo da sociedade (Governance): boas práticas de gestão da empresa.

Note que, em alguns casos, a sigla ESG é substituída pela sigla SRI, correspondente a Socially Responsible Investment (Investimento Socialmente Responsável).

Da gestão de ativos à sustentabilidade: como se constrói esta relação?

Ilustração de jovem a segurar planeta terra

O aumento da popularidade dos fundos sustentáveis acompanhou a tendência social de crescente preocupação com questões comunitárias e ambientais.

Movimentos de defesa da igualdade racial, de ativismo climático e de paridade de géneros – tão marcantes nas gerações mais novas, como os Millennials – fizeram compreender aos investidores que o capital terá, obrigatoriamente, de adaptar-se a um novo ambiente de consumo.

A pandemia global de COVID-19 teve, nos últimos meses, um efeito acelerador nesta tendência, com os mercados a compreenderem que, além do retorno gerado, é importante que as empresas estejam preparadas para responder a crises repentinas sem sacrificar os colaboradores nem as comunidades em que se inserem.

Os números mais recentes comprovam esta tendência: de acordo com a Morningstar, o investimento em fundos sustentáveis disparou 72% só no primeiro trimestre de 2020 – ainda a pandemia estava no início. No fim de junho do mesmo ano, estes produtos financeiros já movimentavam 106 biliões de dólares, deixando adivinhar um crescimento constante para os semestres seguintes.

Mais recentemente, os Estados Unidos também contribuíram para um reforço da nova moda de investimentos: a BlackRock – uma das maiores gestoras de ativos do mundo – anunciou que vai passar a publicar relatórios sobre o impacto climático dos seus fundos de investimento, colocando a sustentabilidade no topo das prioridades do negócio. Espera-se, neste contexto, que outras gestoras de ativos sigam o exemplo da gigante norte-americana.

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Como funcionam os fundos ESG?

Do ponto de vista técnico, os fundos sustentáveis funcionam da mesma forma que os outros: um conjunto de investidores injeta dinheiro em empresas que consideram promissoras para ir recolhendo vantagens financeiras ao longo dos anos seguintes, à medida que essas empresas crescem.

O que muda nos fundos ESG são os critérios de seleção das empresas nas quais investir. Se, num fundo tradicional, basta que a empresa apresente resultados financeiros positivos (e boas previsões para o futuro), nos fundos sustentáveis é imperativo que, para chegar a esses resultados, as empresas não sacrifiquem o ambiente nem a sociedade.

Desta política resulta que os fundos sustentáveis só incluem na carteira de investimentos opções social e ambientalmente responsáveis, excluindo à partida alguns setores de atividade (como o tabaco, o entretenimento para adultos ou a extração de combustíveis fósseis).

A oferta de fundos sustentáveis em Portugal

Também no mercado português está a crescer o investimento sustentável, embora ainda a um ritmo mais lento do que no resto da Europa. De acordo com os dados mais recentes da CMVM, no final de 2019 havia perto de 20 mil investidores com posição em fundos ESG.

No entanto, e apesar de o interesse dos investidores portugueses em fundos sustentáveis ainda ser baixo, é previsível que o mercado venha a ganhar força, impulsionado pelo posicionamento das gestoras de ativos internacionais e pela cada vez mais elaborada regulamentação europeia nesta área.

Em resposta a essa previsão, há neste momento algumas instituições com ofertas de fundos sustentáveis para o mercado nacional:

Caixa Geral de Depósitos

A CGD foi pioneira em Portugal na oferta de fundos sustentáveis e tem hoje dois em portefólio: o Caixa Investimento Socialmente Responsável e o Caixa Ações Europa Socialmente Responsável.

IMGA

Esta gestora de fundos também oferece duas opções ESG: o Iberia Fixed Income ESG e o IMGA Iberia Equities ESG.

Santander

O banco espanhol também foi dos primeiros a entrar na corrida e também tem duas ofertas de fundos de investimento sustentável: o Santander Sustentável e o Santander Future Wealth.

GNB

A gestora do Novo Banco entrou muito recentemente no mercado dos fundos sustentáveis e conta, neste momento, com apenas um produto em portefólio: o NB Momentum Sustentável.

Como investir em fundos ESG?

Ilustração de planeta verde numa fotografia de uma paisagem

Há várias formas de abordar o investimento em fundos sustentáveis. Os especialistas categorizam-nas em quatro grandes tipos:

1

Abordagem negativa

Esta abordagem aos fundos ESG concentra-se em excluir da carteira de investimentos um conjunto de empresas, negócios e setores de atividade que são considerados, à partida, prejudiciais para o ambiente ou a sociedade.

O grau de negatividade desta abordagem pode variar. Numa forma mais suave, a exclusão afeta apenas negócios extremos, como armas, tabaco e jogos. Numa forma mais restrita, podem ficar de fora opções de investimento em obrigações de dívida de países que não cumpram as leis internacionais ou o pacto das Nações Unidas.

2

Abordagem de impacto

Esta abordagem aos fundos sustentáveis caracteriza-se pelo foco em soluções específicas para desafios ESG concretos, como a promoção da igualdade racial ou a limpeza de plástico dos oceanos.

Numa forma menos restrita, esta abordagem pode ficar-se pela escolha de uma área específica de atividade, como as energias renováveis ou a agricultura sustentável.

Em todo o caso, o investimento de impacto centra-se sempre em objetivos concretos e procura resultados mais evidentes.

3

Abordagem ativa

Nesta estratégia, os gestores dos fundos sustentáveis posicionam-se como gestores ativos dos negócios em que investem, dando uso ao seu direito de voto nas assembleias gerais para influenciar as práticas de gestão no sentido de beneficiar o ambiente e a sociedade.

4

Abordagem positiva

Semelhante à abordagem negativa, esta forma de encarar os fundos sustentáveis troca a exclusão pela restrição da aceitação, ou seja, em vez de recusar determinados negócios, só aceita um conjunto específico de opções.

Para que as suas ações sejam incluídas num portefólio de investimento com abordagem positiva, as empresas sabem que têm de respeitar um conjunto de regras pré-determinadas, porque os gestores só vão considerar injetar dinheiro nos melhores de cada setor.

Convém notar, contudo, que esta abordagem pode pecar na rentabilidade e no risco, uma vez que coloca ambos os critérios abaixo do de eligibilidade ESG.

Como identificar um investimento sustentável?

Se está interessado em iniciar-se no investimento em fundos sustentáveis, o primeiro passo é saber identificá-los entre a restante oferta disponível no mercado.

A primeira coisa a saber é que os fundos sustentáveis incluem sempre na denominação termos como “sustentável”, “responsável”, “impacto” e “verde”. Também podem vir acompanhados das siglas ESG ou SRI.

Em caso de dúvida, pode sempre confirmar as fichas técnicas dos produtos que está a considerar, uma vez que o caráter ESG certamente estará referido nos prospetos ou, no mínimo, no Documento Chave de Informações ao Investidor (KIID).

Fundos ESG vs fundos éticos

Para terminar, uma distinção importante: fundos ESG não são a mesma coisa que fundos éticos.

No caso dos primeiros, já vimos que consideram apenas um conjunto de opções de investimento que garantem o respeito pela preservação ambiental e pelas boas práticas sociais e de gestão empresarial; no caso dos segundos, a carteira de opções considera os valores éticos dos negócios.

De uma forma mais simples, temos que um fundo ESG cumpre valores éticos, mas nem sempre um fundo ético cumpre os critérios ESG (porque, ainda que louváveis, os valores podem não respeitar, simultaneamente, o ambiente e a sociedade).

Na prática, um fundo ético exclui negócios como armas e álcool, mas não exclui, obrigatoriamente, uma obrigação de dívida de um país que desrespeita os direitos humanos.

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