Numa altura em que tanto se fala sobre a flexibilização da carga laboral, nomeadamente sobre a distribuição de dias de trabalho e de dias de descanso, com a questão dos quatro dias úteis para o efeito, e tendo como mote as condições para o trabalho digno, importa conhecer o que diz a lei atualmente em vigor sobre o horário flexível em Portugal.
Atualmente, os trabalhadores pais de menores de 12 anos ou maiores dependentes, com deficiência ou doença crónica, ou noutra situação que o justifique, têm direito ao regime de horário flexível – ou seja, a possibilidade de gestão do horário laboral nos dias de trabalho, por razões legalmente já previsíveis.
O Código do Trabalho prevê, assim, a modalidade de horário flexível para os profissionais com responsabilidades familiares e em situações específicas.
Saiba em que circunstâncias pode solicitar este regime de trabalho e quais os procedimentos para o requerer. Conheça os seus direitos.
Tudo sobre o regime de horário flexível
Em que consiste?
O horário flexível permite ao trabalhador gerir os seus tempos de trabalho diário. Assim pode escolher, para o efeito, as horas de entrada e de saída do período normal de trabalho, ainda que respeitando determinados limites imposto por lei.
Qual o princípio subjacente?
Subjacente ao direito ao regime de horário flexível está o princípio da conciliação da vida profissional com a vida familiar, aplicável também ao vínculo de emprego público.
Trata-se de uma modalidade prevista no Código do Trabalho, para o “trabalhador com responsabilidades familiares”.
De acordo com o disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 59º da Constituição da República Portuguesa estabelece-se como garantia de realização profissional das mães e pais trabalhadores que
Todos os trabalhadores, (…) têm direito (…) à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar.
Assim, o horário flexível é prevê a proteção e respeito pela família, sem prejuízo para as funções profissionais exercidas.
Como funciona?
O regime de horário flexível prevê algumas regras essenciais:
- Deve conter, obrigatoriamente, duas plataformas fixas – ou presenças obrigatórias – da parte da manhã e da parte da tarde, as quais não podem ter, no seu conjunto, duração inferior a 4 horas;
- Não pode afetar o regular e eficaz funcionamento dos serviços, especialmente no que respeita às relações com o público;
- Horas consecutivas e pausas de trabalho;
- Podem ser prestadas, em regime de horário flexível, 9 horas diárias de trabalho por dia, em períodos nunca superiores a 5 horas consecutivas;
- A duração das pausas para descanso não pode ser inferior a 1 hora ou superior a 2 horas.
O cumprimento da duração do tempo de trabalho deve ser aferido ao fim de cada mês. Por dia, o trabalhador deve apresentar uma média de 7 horas de trabalho, num total de 35 horas semanais. Significa que poderá fazer apenas 5 horas num dia e compensar as 2 restantes em dias seguintes.
Regime de horário flexível: como pedir
O trabalhador que pretenda trabalhar em regime de horário de trabalho flexível, designadamente para prestar assistência a filho menor de 12 anos ou maior dependente de cuidados inadiáveis, por deficiência ou doença crónica, deve solicitá-lo ao empregador, por escrito, com a antecedência de 30 dias, com os seguintes elementos:
- Prazo previsto, dentro do limite aplicável;
- Declaração onde conste que o menor vive com ele em comunhão de mesa e habitação.
E se o empregador recusar?
O empregador pode recusar o pedido apenas com fundamento em exigências imperiosas do funcionamento da empresa, ou na impossibilidade de substituir o trabalhador se este for indispensável.
No prazo de 20 dias contados a partir da receção do pedido do trabalhador, o empregador deve comunicar ao mesmo a sua decisão, também por escrito.
Em caso de recusa, o empregador deve indicar o respetivo fundamento, podendo o trabalhador reclamar da decisão. Para o efeito, deve apresentar, por escrito, uma apreciação no prazo de cinco dias a partir da receção da comunicação da intenção de recusa do empregador.
Nos cinco dias subsequentes ao fim do prazo para apreciação pelo trabalhador, o empregador envia o processo para apreciação pela Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, com cópia do pedido, do fundamento da intenção de recusa da apreciação do trabalhador.
A referida entidade notifica o empregador e o trabalhador do seu parecer, no prazo de 30 dias. Caso não seja respeitado o prazo apresentado, considera-se que a resposta é favorável à intenção do empregador. Assim, o pedido ficará negado.
Se, por outro lado, o parecer for desfavorável à intenção do empregador, este terá de seguir para a via judicial a fim de ver reconhecido motivo justificativo da recusa de horário flexível ao trabalhador.
Aconselha-se que o trabalhador se informe devidamente, nomeadamente junto de um advogado. Assim assegura a correta elaboração do pedido de autorização de trabalho em regime de horário flexível.
Essencial do regime de horário flexível de trabalho
O regime de horário flexível trabalho aplicado ao profissional que o solicite, ainda que seja elaborado pelo empregador, deve reunir os seguintes dados:
- Indicação de um ou dois períodos de presença obrigatória (plataforma fixa) com duração igual a metade do período normal de trabalho diário estipulado. Por exemplo, para um período normal de trabalho diário de sete horas, os períodos de presença obrigatória no local de trabalho poderão acontecer das 10h00 às 12h30 e das 13h00 às 14h30;
- Indicar os períodos para início e termo do trabalho diário, sendo que cada um deve ter uma duração não inferior a um terço do período normal de trabalho diário. Essa duração pode ser reduzida sempre que necessário a fim de respeitar o período de funcionamento do estabelecimento;
- Estabelecer um período para descanso, nunca superior a duas horas.
Todos os profissionais que exerçam a sua atividade em regime de horário flexível podem cumprir até seis horas consecutivas de trabalho e até dez horas de trabalho (plataforma flexível) em cada dia. Devem sempre cumprir o tempo correspondente a cada mês, como já explicado acima.
Os trabalhadores que optem pelo trabalho em regime de horário flexível, designadamente para prestar assistência inadiável e imprescindível a filho com deficiência ou doença crónica, não podem ser penalizados em matéria de avaliação e de progressão na carreira.
Deveres do empregador previsto na lei
Tanto a Constituição da República Portuguesa (CRP), como o Código do Trabalho (CT), preconizam o dever de o empregador proporcionar aos trabalhadores as condições de trabalho que favoreçam a conciliação da actividade profissional com a vida familiar e pessoal [vide alínea b) do artigo 59º da CRP, e o nº 3 do artigo 127º do CT].
Está igualmente definido como um dever do empregador a elaboração de horários que facilitem essa conciliação, nos termos da alínea b) do nº 2 do artigo 212º do CT.
Este acervo legislativo é também aplicável aos trabalhadores com vínculo de emprego público por remissão da alínea d) do nº 1 do artigo 4º da Lei nº 35/2014, de 20 de Junho, que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP).
Para mais informações sobre o regime de horário flexível de trabalho, consulte a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego ou ainda a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).