Insolvência pessoal singular é o nome jurídico dado ao processo judicial que permite a recuperação de devedores que não conseguem pagar as suas dívidas nos prazos acordados, uma vez que não têm dinheiro nem bens que possam ser entregues ao banco ou penhorados.
Solicitar este tipo de processo significa “abrir falência” e torna-se numa solução para os problemas financeiros, que têm vindo a aumentar cada vez mais nos últimos anos, devido à crise económica. O pedido de insolvência, que pode ser feito tanto por empresas como particulares, só deve ser efetuado quando não existirem quaisquer meios que assegurem o pagamento das dívidas.
Pense bem antes de pedir insolvência pessoal
Como já foi referido anteriormente, o devedor só pode solicitar este processo judicial se não possuir nenhum meio que assegure o pagamento das dívidas. Por isso, antes de requerer uma insolvência pessoal singular, o melhor é analisar bem a sua situação financeira para perceber se existe ou não outra solução para pagar as suas dívidas, como por exemplo cortar nos gastos supérfluos ou procurar outras fontes de rendimentos.
Uma das medidas que podem ajudar nesta tarefa é a realização de um inventário, onde deve inserir todos os seus créditos e responsabilidades e apontar as informações de todos esses créditos, como montante, taxa de juro, e finalidade, entre outras. Por vezes, a negociação de créditos e redução de prestações pode equilibrar o orçamento familiar. Se sentir dificuldades na realização do inventário, peça ajuda a um especialista em finanças e tire depois as dúvidas com um advogado experiente e em quem tenha confiança, pois este poderá ajudá-lo a perceber o que deve fazer e como fazê-lo, se chegar à conclusão de que tem mesmo de pedir insolvência pessoal singular.
Insolvência pessoal singular: como dar início ao processo
Quando é que um indivíduo é considerado insolvente?
Um indivíduo é considerado insolvente quando fica impossibilitado de cumprir com as suas obrigações vencidas, segundo o ponto número um do artigo n.º 3 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE). Isto acontece quando os ativos do devedor são inferiores aos seus passivos. No entanto, este só será considerado oficialmente insolvente quando houver uma sentença do tribunal a declará-lo como tal.
Durante o processo irá ocorrer um levantamento do rendimento do devedor, e origens do mesmo, tal como das suas despesas, que terão de ser comprovadas, bem como do seu património, que poderá ter de ser vendido na totalidade. Será também definido um rendimento mínimo de subsistência. Todo o rendimento que o devedor receber acima desse montante terá de ser entregue para liquidar as dívidas.
Objetivo do pedido
O pedido de insolvência pessoal singular, também denominado pedido de falência, serve para que as penhoras ativas ou iminentes possam vir a ser abolidas. O seu tempo de entrada varia consoante os casos, podendo chegar aos 5 meses em algumas situações. O processo de insolvência pessoal pode seguir duas vias, sendo elas:
- Elaboração de um plano de pagamentos realizado pelo devedor;
- Insolvência pessoal com exoneração do passivo restante.
Na primeira opção, elaboração de um plano de pagamentos realizado pelo devedor, o plano é avaliado pelos credores para que estes decidam se aceitam ou não a renegociação de dívidas e prazos. A segunda opção, insolvência pessoal com exoneração do passivo restante, serve para que o devedor possa ir pagando uma determinada quantia, consoante os os seus rendimentos, aos credores durante os 5 anos que se seguem após a aprovação do pedido de insolvência. Após esse período de tempo, as restantes dívidas por pagar são perdoadas, à exceção das dívidas fiscais.
Onde deve ser solicitado o pedido
O pedido de insolvência pessoal singular deve ser requerido no tribunal da área de residência do devedor. O melhor é a pessoa interessada contratar um advogado especializado em insolvências, uma vez que este poderá atenuar as consequências do processo, como nos casos em que é exigida a imediata penhora de bens imóveis, por exemplo.
Requisitos
Para ser-lhe permitido pedir insolvência pessoal, o devedor não pode ter:
- Um passivo global superior a 300 mil euros;
- Explorado uma empresa 3 anos antes de requerer o pedido de insolvência;
- Dívidas laborais;
- Mais de 20 credores.
Custos do pedido de insolvência pessoal singular
O preço costuma variar entre os 500€ e 3.500€, uma vez que os gastos da solicitação de insolvência variam de acordo com a contratação escolhida pelo interessado. O montante mais elevado deve-se à contratação de um bom advogado para que o devedor possa ter a melhor defesa possível.
Se o devedor não conseguir suportar os gastos de um pedido de insolvência, pode recorrer ao apoio jurídico da Segurança Social. Para isso, terá de preencher e entregar a documentação exigida e depois aguardar entre duas a três semanas para saber se o pedido foi ou não aprovado.
Pedido de insolvência feito por singulares
No caso de pessoas singulares, a solicitação deste pedido pode ser feita de duas formas, sendo elas pessoal ou conjugal. A insolvência pessoal singular envolve apenas uma pessoa e a insolvência conjugal abrange os dois elementos do casal, podendo esta última ser requerida apenas por casais unidos em regime de comunhão geral de bens ou em regime de adquiridos. No caso de duas pessoas que estejam casadas em regime de separação de bens só pode ser requerida a insolvência pessoal. O pedido de insolvência pode seguir duas vias:
- Liquidação: venda dos bens, que ficam apreendidos;
- Elaboração de um plano de insolvência.
Processo de insolvência pessoal singular em 9 passos
1. Contratação de um advogado
Para as ações com um valor superior a 5.000€, é necessária a contratação um advogado que o represente, uma vez que o Código do Processo Civil refere ser necessária a constituição de um mandatário para a sua representação.
2. Requerimento de insolvência
O processo de insolvência pessoal tem de começar com um pedido escrito, que deve ser dirigido ao tribunal da residência do devedor. Para conseguir realizar esse requerimento, com o pedido de exoneração do passivo restante, é necessário que o devedor reúna determinados e informações acerca da sua situação financeira, como por exemplo a indicação dos credores e da morada dos mesmos, a data de incumprimento, o estado civil e registo criminal, entre outros.
3. Declaração de insolvência
O tribunal tem de proferir uma declaração de insolvência se considerar que se encontram reunidas as condições para tal. Só desta forma o devedor poderá ser considerado oficialmente insolvente. Cabe ainda ao juiz nomear um administrador de insolvência para acompanhar o processo.
4. Plano de pagamento aos credores
O tribunal deve traçar um plano de pagamentos aos credores e decidir o destino de todos os rendimentos do devedor, o que inclui a referida nomeação de um administrador judicial para que este fique responsável por gerir o dinheiro do devedor. O pagamento feito aos credores segue uma ordem de prioridades, sendo prioritárias as dívidas à Autoridade Tributária e Aduaneira e à Segurança Social. O tribunal pode ainda determinar a venda dos bens do insolvente.
5. Publicação da sentença de declaração de insolvência
É necessária a publicação da sentença de declaração de insolvência para que todos os credores com créditos sobre o devedor possam assim reclamá-los. A sentença tem de ser igualmente comunicada ao Banco de Portugal para que o nome do insolvente seja inscrito na central de riscos de crédito.
6. Reclamações dos credores
Cabe ao administrador de insolvências receber as reclamações de créditos por parte dos credores. Se estivermos a falar de um caso de liquidação, algo comum quando se trata de insolvência pessoal, o administrador tem de apreender todos os bens do insolvente, inclusive a habitação do mesmo, e depois determinar-lhes um valor e realizar um relatório que contenha a relação entre os ativos e os passivos do insolvente.
7. Assembleia de credores
O relatório acima referido deve ser analisado através de uma assembleia de credores, ainda que estes não possuam poder de veto em relação à decisão do tribunal. No entanto, podem dar as suas opiniões e tentarem impedir a exoneração do passivo restante, por exemplo, se acharem que ocorreu uma má atuação por parte do devedor.
8. Início da liquidação dos bens
Após a análise e votação do relatório sobre a relação entre os ativos e os passivos do insolvente, o administrador da insolvência deve dar início ao processo de liquidação dos bens para o pagamento aos credores.
9. Cumprimento das obrigações
Quando tiverem passado cinco anos, o administrador da insolvência deve dar conhecimento ao tribunal do cumprimento ou não cumprimento das obrigações. Se estas tiverem sido cumpridas pelo insolvente, haverá um despacho pelo juiz para conceder à pessoa insolvente a exoneração do passivo que não foi pago no processo de insolvência, ficando assim todas as dívidas perdoadas.
No entanto, a exoneração do passivo não tem efeito no que respeita aos créditos tributários e aos créditos da Segurança Social, o que significa que não há perdão dessas dívidas mesmo após os cinco anos do período de cessação, ou seja:
- Créditos tributários (como dívidas às Finanças);
- Créditos por multas, coimas e outras sanções por crimes ou contraordenações;
- Indemnizações devidas por factos ilícitos fraudulentos praticados pelo devedor;
- Créditos por alimentos.
Consequências da insolvência pessoal singular
Um dos motivos pelo qual deve ver o pedido de insolvência pessoal singular como último recurso está relacionado com o facto deste processo ter implicações sérias na sua vida pessoal e financeira. Conheça algumas das consequências.
1. Perda total do património
O insolvente perde a propriedade de todos os seus bens que podem ser penhorados, ou seja, aqueles que não sejam essenciais para a sua subsistência. O administrador de insolvência procede à apreensão dos mesmos para que haja a liquidação (venda dos bens) e depois a repartição do correspondente produto pelos credores. A habitação, o automóvel e alguns eletrodomésticos estão entre os bens que poderão ser vendidos.
2. Perda de controlo sobre o seu rendimento
Além de perder o controlo sobre o seu património, o mesmo acontece com o seu rendimento, visto que terá de entregar parte dele para liquidar dívidas e não poderá assim ocultar qualquer tipo de rendimentos. Desse rendimento que aufere, só poderá receber o montante equivalente ao salário mínimo nacional para que o resto sirva para pagar essas dívidas. Caberá ao gestor de insolvência decidir por si a sua vida financeira.
3. Nome inserido no Banco de Portugal
Irá ver o seu nome inscrito na base de dados de riscos de crédito do Banco de Portugal, o que o classificará como um cliente de risco e a quem não deve ser dada confiança por parte do setor financeiro. Estar cadastrado nesta entidade significa ficar impossibilitado de recorrer a crédito e de passar cheques, entre outras coisas. O Registo Civil também terá essa informação durante cinco anos.
4. Declaração de insolvência em Diário da República
A publicação da declaração de insolvência será feita em Diário da República. Essa insolvência será ainda afixada por edital no local de trabalho do insolvente e no tribunal.
5. Obrigatório ter emprego
Quem se encontra na situação de insolvência pessoal é obrigado a ter um emprego regular e remunerado para que possa gerar rendimento para liquidação da dívida.
6. Residência estipulada
O insolvente tem de permanecer na residência estipulada na sentença de insolvência pessoal até que o processo termine.
7. Apresentação em tribunal
O insolvente deve apresentar-se em tribunal sempre que é chamado e colaborar com todos os órgãos da insolvência durante o processo de insolvência pessoal.
8. Cumprimento do plano definido pelo juiz
O insolvente terá de cumprir rigorosamente, durante cinco anos, o plano de pagamento da dívida definido pelo juiz. Se essas obrigações tiverem sido cumpridas após o período estabelecido, o administrador da insolvência dará conhecimento ao tribunal do cumprimento das mesmas e será feito um despacho pelo juiz para conceder à pessoa insolvente a exoneração do passivo que não foi pago no processo de insolvência, ficando assim todas as dívidas perdoadas.
9. Suspensão de penhoras
Uma consequência positiva da insolvência pessoal é que todas as penhoras e outras diligências executivas que estiverem a ser efetuadas contra o devedor terão de ser suspensas devido à declaração de insolvência, mesmo que tenham sido pedidas antes dessa insolvência, tendo nesses casos de ser levantadas. Também não pode ocorrer qualquer tipo de ação judicial por parte dos respetivos credores para a cobrança coerciva dos respetivos créditos, seja ela declarativa ou executiva.