Sabe-se que que serão cerca de 115 mil as pessoas que, apesar de possuírem défice auditivo, desconhecem a Língua Gestual Portuguesa (LGP). Além disso, desconhece-se, ao certo, quantos surdos existem em Portugal, por falta de estatísticas.
Os Censos de 2001 registaram 84.172 deficientes auditivos, sendo que não é claro qual a verdadeira percentagem de surdos, considerando que é feita distinção entre quem não ouve e quem tem algumas dificuldades relacionadas, nomeadamente, com a saúde ou a idade.
Certo é que são muitos os portugueses que, diariamente, comunicam por gestos e outros tantos que, apesar de falantes, aprendem a fazê-lo.
Para que perceba a sua importância, para que esclareça dúvidas, desfaça mitos e para que saiba onde aprender, apresentamos-lhe duas mãos cheias de coisas que deve saber sobre a Língua Gestual Portuguesa.
TUDO SOBRE LÍNGUA GESTUAL PORTUGUESA
É uma língua, não uma linguagem
Este é um erro muito comum entre os ouvintes, incluindo a comunicação social. Não existe linguagem gestual, mas sim língua gestual. Por linguagem entende-se um sistema de símbolos ou objectos constituídos como signos, como a linguagem das cores ou a linguagem corporal.
Uma língua é um sistema de signos, arbitrário e convencional, com gramática, estrutura e dinâmica próprias.
A Língua Gestual Portuguesa (LGP) é o veículo de expressão específico da comunidade surda e os gestos utilizados são constituídos por cinco parâmetros base: configuração de mão, movimento, expressão não-manual, localização e orientação.
Não há surdos-mudos, há surdos
Ao contrário do que possa ter ouvido muitas vezes, não existem surdos-mudos. Uma pessoa surda não ouve, mas tem cordas vocais o que significa que não é muda. Alguns surdos, por opção, por necessidade ou por educação nesse sentido, conseguem falar, apesar de não ouvirem.
Considerando o mecanismo natural, o facto de não ouvir dificulta muito o desenvolvimento da oralidade. Por isso, existe a língua gestual.
Não há uma língua gestual universal
Tal como o idioma, cada país tem a sua própria língua gestual. Em Portugal, à semelhança do que acontece noutros países, existem vários dialetos ou regionalismos, de acordo com a zona do país, o que a torna a língua ainda mais única, rica e complexa.
Em todo o mundo, há diversas línguas gestuais: a ASL (American Sign Language), a BSL (British Sign Language), a LIBRAS (Língua de sinais Brasileira), entre outras. Apesar das diferenças, partilham uma semelhança: nenhuma delas nasce da língua oral do seu país, mas sim da história da comunidade surda que a utiliza.
Uma vez que cada país tem a sua língua gestual, são necessários tradutores e intérpretes capazes de estabelecer a comunicação, para além de intérpretes de Língua Gestual para Língua Oral ou Escrita (e vice-versa).
Estrutura da Língua Gestual Portuguesa
A LGP apresenta uma sintaxe muito diferente do Português. A ordem básica das frases divide-se em SOV (sujeito-objeto-verbo) e OSV (objeto-sujeito-verbo). Na oralidade é equivalente a dizer: Eu trabalho vou/ Trabalho eu vou.
Quanto às interrogativas, declarativas ou exclamativas, essas identificam-se com elementos não manuais, como o arquear das sobrancelhas e dos ombros.
Música e teatro: perceção
Um surdo consegue “ouvir” música. Ou melhor, consegue sentir a vibração e com isso ter a perceção do som. Há espetáculos pensados especificamente para conseguirem chegar também ao público surdo.
Quanto ao teatro, a comunidade surda vai ganhando palco. Há cada vez mais entidades (companhias, instituições) empenhadas em tornar as peças acessíveis a todos.
Aprender LGP: Porquê?
Existem diversos benefícios (ou vantagens) em aprender a LGP, especialmente para quem tem familiares ou amigos surdos. É, igualmente, importante que pedagogos, professores, técnicos de saúde e educação, possuam a capacidade de comunicar em LGP. Dessa forma, contribuir-se-à para uma comunicação mais eficaz e para o bem-estar da comunidade.
É difícil?
Aprender LGP é tão difícil quanto outra língua qualquer. Esta é uma forma de comunicação que se desenvolve tal como as línguas orais, sendo que a única diferença é que são utilizados os movimentos de mãos, corpo e expressões faciais. O essencial é a prática.
Onde aprender?
Com o objetivo de ajudar a derrubar barreiras na comunicação entre surdos e ouvintes, ao longo do tempo, foram aparecendo cursos de Língua Gestual Portuguesa um pouco por todo o país e também online.
Seguem-se algumas possibilidades:
- Associação Portuguesa de Surdos;
- Curso de Língua Gestual na COGNOS – Formação e Desenvolvimento Pessoal, em Vila Nova de Gaia;
- Escola Superior de Educação do Politécnico de Coimbra – curso de Língua Gestual Portuguesa com duração de 6 semestres;
- Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico do Porto – licenciatura em Tradução e Interpretação em Língua Gestual Portuguesa, duração de 6 semestres;
- Associação de Surdos do Porto – curso de LGP para a comunidade ouvinte (nível inicial, intermédio e avançado);
- Escola Virtual de Língua Gestual Portuguesa – uma iniciativa da Associação de Surdos do Porto e da Escola Superior de Educação de Coimbra, disponibiliza uma plataforma de ensino à distância em LGP.
A estes juntam-se outros, de curta ou longa duração, promovidos por associações e outras entidades locais, regionais ou nacionais.
Guia breve da Língua Gestual Portuguesa
Apresentamos algumas dicas essenciais sobre a LGP:
- Existe uma mão dominante, sendo o seu desempenho diferente da mão não dominante;
- Há cinco critérios fundamentais a ter em conta: Configuração das mãos; Movimento das mãos, Local de Articulação; Orientação das mãos; Componente que não usa mãos (expressão e movimento corporal);
- Para definir o género numa frase, apenas se aplica a seres animados e esta marcação ocorre apenas no feminino;
- A numeração é realizada através de repetição, duplicação (usando um gesto com ambas as mãos) ou incorporação (usando um método numeral ou determinativo);
- A estrutura frásica não acompanha os mesmos elementos usados em língua oral;
- A expressão facial é determinante para indicar interrogativas.
No cinema há algumas obras a que vale a pena assistir e que o vão ajudar a perceber o quão importante é que todos saibam comunicar nesta que é uma das línguas oficiais do país.
- “Filhos do Silêncio” que, em 1986, valeu um Óscar à atriz surda Marlee Matlin;
- “Babel”, com Brad Pitt e Cate Blanchett;
- “Nada que eu ouça” que põe em cena temas como os implantes cocleares, a identidade e o orgulho surdo;
- “Mr. Holland – Adorável Professor”;
- “O Milagre de Anne Sullivan”.
O Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa comemora-se a 15 de novembro.