Olga Teixeira
Olga Teixeira
02 Nov, 2023 - 14:45

Sou senhorio: o que muda com o Mais Habitação? 

Olga Teixeira

Se é senhorio, já deve ter percebido que muito mudou com o programa Mais Habitação. Afinal, o que diz a nova lei?

Mais habitação senhorios

O Mais Habitação traz novas regras no arrendamento e mudanças a nível fiscal para os senhorios. Se tem imóveis arrendados, conheça as alterações essenciais nos seus impostos, direitos e deveres.

Dos aumentos nas rendas ao IMI, passando pelos despejos, o pacote legislativo tem algumas novidades que os proprietários devem conhecer.

Alterações a nível fiscal

Ser senhorio implica várias obrigações fiscais em sede de IRS (ou IRC), IMI, AIMI e Imposto do Selo. O Mais Habitação fez algumas alterações a estes impostos que vão ter impacto na carteira dos senhorios.

Isenção de Imposto do Selo

Os contratos de arrendamento habitacional feitos no âmbito do Programa de Apoio ao Arrendamento (PAA, anteriormente conhecido como Programa de Arrendamento Acessível) passam a estar isentos do Imposto do Selo.

Para cada novo contrato de arrendamento é necessário fazer o registo nas Finanças até ao fim do mês seguinte. Com a entrada em vigor do Mais Habitação, se o senhorio não o fizer, os inquilinos passam a ter a possibilidade de fazer a respetiva comunicação à Autoridade Tributária.

IMI: Mais Habitação penaliza senhorios com casas vazias

Os proprietários de imóveis beneficiam de isenções de IMI se promoverem a habitação, sendo penalizados caso tenham terrenos abandonados ou prédios devolutos.

Isenção para quem cria habitação

Se tiver terrenos para construção de habitações ou um imóvel a que pretenda dar utilização habitacional, beneficia de isenção de IMI sobre estas propriedades. A única condição é que tenha pedido um controlo prévio para obras ou para que o imóvel possa ser usado como habitação.

Para beneficiar desta isenção deve entregar, no serviço de finanças da área onde se situam os prédios, um documento que comprove o início do procedimento de controlo prévio.

Os prédios urbanos ou frações autónomas adquiridos, reabilitados ou construídos para serem colocados no PAA beneficiam de isenção de IMI durante três anos. Após este prazo a isenção pode ser renovada, a pedido do proprietário, por mais cinco anos.

Penalização dos devolutos

A nova legislação permite que as câmaras municipais requeiram que prédios urbanos devolutos ou em ruínas passem a ser avaliados como terrenos para construção. Esta avaliação pode resultar na atribuição de um Valor Patrimonial Tributário (VPT) mais elevado, o que agrava o IMI a pagar.

Isenção de AIMI

O AIMI (Adicional ao IMI) deixa de se aplicar se os imóveis (apenas prédios urbanos) se destinarem a habitação e estiverem enquadrados no Programa de Apoio ao Arrendamento.

Mais habitação inquilinos
Veja também Mais Habitação: o que muda para os inquilinos?

Mais habitação e o IRS dos senhorios

O Mais Habitação traz algumas hipóteses de poupanças para os senhorios. Além de pagarem menos IRS pelas rendas recebidas, há situações em que podem beneficiar de isenção.

Rendas pagam menos IRS

O Mais Habitação fez descer o IRS dos senhorios. Até agora, os rendimentos prediais por arrendamento eram tributados a 28%, exceto nos casos em que se optava pelo englobamento. A nova taxa de tributação autónoma é de 25%.

Esta taxa pode ser ainda mais baixa se os contratos de arrendamento tiverem uma duração maior:

  • entre 5 e 10 anos: 15% e redução de 2% em cada renovação com igual duração, até ao limite de 10%;
  • entre 10 e 20 anos: 10%
  • mais de 20 anos: 5%

Devolução do seguro da renda no IRS

Os prémios dos seguros de renda passam a poder a contar para as deduções do IRS dos senhorios, que já podiam deduzir despesas relacionadas com a gestão e manutenção do imóvel, incluindo obras e quotas de condomínio.

Incentivo para deixar o AL

Se tem um apartamento em regime de Alojamento Local (AL) e pensa colocá-lo no mercado de arrendamento tradicional,  terá isenção de IRS ou IRC sobre os rendimentos obtidos com as rendas até ao final de 2029, sem limite no valor.

A medida aplica-se aos imóveis com registo de AL feito até 31 de dezembro de 2022 e contratos de arrendamento que venham a ser feitos até ao fim de 2024.

Isenção de mais-valias

Outra novidade que o Mais Habitação traz para os proprietários de imóveis é a isenção de pagamento de mais-valias na venda de terrenos para construção ou de segundas habitações se o dinheiro ganho na transação for usado para amortizar um crédito habitação (próprio ou dos filhos ou netos. A medida aplica-se às vendas efetuadas em 2022, 2023 e 2024. Para beneficiar desta isenção a medida tem de ocorrer nos três meses que se seguem à venda.

Se tiver imóveis destinados a habitação e os vender ao Estado beneficia igualmente de isenção de mais-valias em IRS e IRC.

IMT

A compra, construção ou reabilitação de imóveis destinados ao arrendamento no PAA está isenta do pagamento deste imposto. O Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis aplica-se às transações de imóveis de valor superior a 97.064 euros (valor em 2023).

Limite nas novas rendas

O Mais Habitação impõe aos senhorios um limite no valor das rendas a cobrar em novos contratos de arrendamento. Se a casa esteve arrendada nos últimos 5 anos, o valor a pagar pelos novos inquilinos não pode ser mais do que 2% superior ao que os anteriores pagavam. Assim, se a renda anterior era de 700€, a nova será, no máximo, de 714€.

Há, no entanto, situações em que o senhorio pode cobrar um valor mais elevado.

Se não aumentou a renda aos antigos inquilinos, pode incluir, no novo contrato, as atualizações de acordo com os coeficientes anuais que têm em conta a inflação. O valor do coeficiente para 2023 é 1,0543.

Se fez obras de remodelação ou de restauro, o novo contrato de arrendamento pode refletir o valor das despesas que suportou, até um limite de 15% por ano. Para poder cobrar esta renda mais elevada terá de ter um comprovativo da Câmara Municipal, confirmando a realização das obras.

Compensação no IRS

Como forma de compensar os senhorios pela limitação ao aumento das rendas, o Mais Habitação prevê que seus os rendimentos prediais (Categoria F no IRS), após feitas as deduções permitidas, venham a beneficiar da aplicação de um coeficiente de 0,90. Quando os rendimentos forem provenientes de contratos de arrendamento com duração mais elevada, o coeficiente varia entre 0,45 e 0,90.

Ou seja, podem ficar isentos de tributação até 9% dos rendimentos obtidos.

Contratos mais antigos congelados

Os contratos de arrendamento anteriores a 1990 em que os inquilinos tenham mais de 65 anos, incapacidade superior a 60% ou rendimentos anuais inferiores a 5 x RMNA (Retribuição Mínima Nacional Anual, que corresponde a 14 x o salário mínimo) não transitam para o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).

Isto significa que as rendas não podem aumentar de acordo com os coeficientes que se aplicam a outros contratos e que têm como base o valor da inflação.

A compensação por este congelamento de contratos está prevista no Orçamento do Estado para 2024 (OE 2024). Assim, os senhorios nestas condições vão ficar isentos de pagar IRS sobre os rendimentos obtidos por estes arrendamentos, enquanto estes contratos se mantiverem em vigor.

O OE 2024 também determina isenção de IMI para os imóveis em que os inquilinos fiquem no anterior regime do arrendamento urbano.

Mais Habitação e senhorios: como ficou o arrendamento forçado?

A obrigatoriedade de arrendar casas vazias há mais de dois anos foi uma das medidas mais polémicas do programa Mais Habitação, mas a versão final da lei é, afinal, diferente do se discutiu inicialmente.

A medida de arrendamento coercivo aplica-se apenas a imóveis fora do interior do país. Não abrange casas de férias, habitações de pessoas de que estejam em lares ou sejam cuidadores informais, casas de imigrantes ou de pessoas que se tenham ausentado por razões profissionais, de saúde ou formativas.

Como funciona o arrendamento forçado?

As câmaras municipais terão a responsabilidade de verificar as condições de habitabilidade dos edifícios e detetar situações de arrendamento ou subarrendamento ilegais.

Perante a existência de edifícios devolutos, as câmaras notificam os proprietários para que façam as obras necessárias, deem uso ao imóvel ou apresentem uma proposta de arrendamento (com uma renda que não pode ultrapassar em mais de 30% a que seria praticada no regime de arrendamento acessível).

O proprietário tem 90 dias para responder a esta notificação. Se não o fizer, a câmara municipal pode proceder ao arrendamento forçado do imóvel ou remeter a informação ao Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU).

Novas regras nos despejos 

Os despejos passam a ser tratados através do Balcão do Arrendatário e do Senhorio (BAS), que notifica o inquilino para que, no prazo de 15 dias, desocupe o imóvel, pague as rendas em atraso (caso existam) ou se oponha ao despejo.

Se o inquilino não apresentar oposição no prazo estabelecido, o processo passa imediatamente ao juiz, para que este determine que o notário ou agente de execução se desloque ao imóvel e tome posse do mesmo.

Caso exista oposição, o prazo para recurso aos tribunais é de 10 dias e a audiência tem de ocorrer no prazo de 20 dias após a entrada do processo. Se o tribunal der razão ao senhorio, o inquilino tem 30 dias para desocupar a casa.

Programa Arrendar para Subarrendar

O Mais Habitação criou o programa Arrendar para Subarrendar, que permite que os senhorios arrendem as casas ao IHRU, que depois as subarrenda aos interessados.

Os contratos ao abrigo deste programa têm uma duração de 5 anos, renováveis por um mínimo de 3. O valor das rendas deve respeitar os limites do PAA, mas pode, em casos especiais, ser 30% superior a estes limites.

Fontes

Diário da República Eletrónico: Lei n.º 56/2023 – Aprova medidas no âmbito da habitação (Pacote Mais Habitação); Lei n.º 6/2006 (Novo Regime do Arrendamento Urbano)

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