Eu gostava de dizer que os portugueses estão a aprender com as lições do passado e com as do presente, mas ainda não consigo. Tenho, com muita pena minha, um visão pessimista da forma com a maior parte das famílias continua a lidar com o dinheiro e os créditos.
Não estou a dizer que as coisas não estão a melhorar, porque estão. Mas tão lentamente que quase não se nota. O caso dos novos créditos à habitação são um bom exemplo disso.
Créditos à habitação com taxa de juro fixa ou mista dispararam durante a crise
Mas isso não é normal e inteligente, face ao aumento astronómico das taxas Euribor? Sim, é. O problema é que estou convencido de que a maioria das pessoas que escolheu agora essa opção não sabe exatamente as razões por trás dessa escolha.
O critério dos portugueses é quase sempre “o mais barato”, a prestação mais baixa e o que lhes deixa mais dinheiro no bolso. Mas não percebe nem consegue explicar as vantagens e desvantagens de cada uma dessas decisões. Se a prestação é mais baixa, é a melhor prestação, mesmo que depois pague o dobro ou o triplo ao longo do tempo.
Qual é a melhor opção?
Como sabem, Portugal é um país à parte na Europa no que diz respeito aos créditos à habitação. Sobretudo no norte da Europa, a grande maioria das pessoas que compra casa, escolhe taxa fixa. Nos Estados Unidos também. Nem considera a hipótese de escolher um preço que varia ao longo dos meses. Portugal é um dos países que vai contra essa lógica e, ao longo dos anos, escolheu sempre maioritariamente a taxa variável. Porquê?
Porque, obviamente, era mais barato (na altura). Com raras exceções, sempre compensou face à taxa fixa. Sim, fiz a conta. Racionalmente, era a melhor opção. Aliás, depois desta crise, provavelmente quando fizermos a média dos últimos 10, 15 ou 20 anos, continuará a compensar optar pela taxa variável. O problema são os imprevistos e as subidas repentinas da Euribor.
Se todas as famílias portuguesas tivessem um Fundo de Emergência robusto e consciência de que de x em x anos a Euribor dispara e que vão ter de aguentar, tudo isto seria “normal”.
Mas, infelizmente, devido aos nossos baixos salários e falta de literacia financeira, é muito mais difícil gerir estes momentos de crise.
O que está a mudar?
O Banco de Portugal divulgou que os créditos à habitação com taxa de juro fixa ou mista aumentaram de cerca de 15% para quase metade (49%) das novas operações de crédito no último ano, com destaque para os contratos com taxa mista.
Face ao período homólogo (mesmo mês do ano passado), a prestação média mensal subiu 105 euros. Claro que, sendo uma média, muitas prestações são de 200 euros e muitas são de 700, 900, ou mais de 1.000 euros. Mas a subida é indicadora de situações difíceis, quando não há margem no orçamento familiar.
Porque é que a literacia financeira é tão importante? Porque, aparentemente, as taxas Euribor terão atingido o pico e pode acontecer começarem a descer muito lentamente ao longo dos próximos meses. Mas atenção que não há bolas de cristal. Ainda falta saber se o BCE vai fazer uma nova subida dos juros na próxima revisão. O aumento da inflação em julho não são boas notícias.
Portanto, quem fez taxa fixa ou mista agora, por “aflição”, vai pagar esta segurança agora durante dois ou 3 anos (ou mais) bem cara. Vai ver as prestações dos outros baixarem (mais ou menos lentamente) e sentir que fizeram o que tinham de fazer, por necessidade. Por outro lado, ninguém sabe o que vai acontecer. Quem se mantiver – como eu – com taxa variável – pode ver a Euribor a subir ainda mais e você travou isso a tempo. Só saberemos daqui a uns bons meses.
Em resumo, se conseguir renegociar o seu crédito à habitação, faça-o o quanto antes. Aliás, já o devia ter feito. Se tem um spread de 1%, e teme não aguentar próximas subidas, pondere uma taxa fixa ou mista que lhe garanta algum descanso durante esta instabilidade.
Se tem um spread baixo (antigo) e conseguir aguentar estas prestações altas durante mais um ano, pode arriscar e esperar e ver o que acontece, em vez de perder de vez um spread de 0,5 ou 0,6. É mais uma questão emocional do que financeira.
O problema que continuo a identificar é que muitos portugueses continuam a tomar decisões financeiras quando o fogo já está a chegar perto da casa em vez de limparem o pinhal à volta durante o inverno.