Tinha recebido uns ténis usados que transportava pendurados na mochila, o que tornava o desafio ainda maior. Tive que caminhar quase cinco quilómetros, que mais pareceram vinte, até estar perto da saída da cidade.
Com o mp3 ligado e os fones nos ouvidos ia a ouvir várias músicas e todas me soavam tão bem… sempre me faziam recordar algo, fossem os últimos dias ou momentos vividos em Portugal. Passadas seis horas, quatro boleias, paisagens de tirar o fôlego, uma fronteira, uma oferta de uma empada numa das boleias… já estava em Osorno, no Chile.
Ainda tentei pedir boleia, mas não demorou muito a anoitecer e aproveitando a bela noite que se fazia sentir apenas me deitei no meio de uns arbustos perto da estrada com o colchão por baixo e o saco de cama. Adormecer a ver as estrelas no céu era como estar no meio do universo, longe do planeta Terra.
O problema foi que pelas quatro da manhã começou a chover e não tinha espaço para montar a minha tenda! Tentei abrigar-me com o impermeável, mas pouco ajudou. Além de ter ficado com parte da roupa molhada não dormi quase nada até amanhecer. Novamente na estrada, tentei secar parte da roupa, o que foi difícil, devido às nuvens e à humidade que se fazia sentir.
Consegui várias boleias, numa fui deixado numa estação de serviço, para me abrigar da chuva que caía como se não houvesse amanhã. Não tive outra hipótese a não ser aguardar que parasse. Mas não parecia parar, comi o resto do arroz que tinha e agora só me sobrava a granola (o meu alimento SOS), e duas empadas que iria guardar, uma para o jantar, outra para o pequeno-almoço.
Quando a chuva parou fui para a estrada, e o condutor que me tinha visto na estação de serviço parou e deu-me boleia. Depois das perguntas já habituais (De onde sou? Quantos anos tenho? Há quanto tempo a viajar? O que fazia em Portugal?), disse-me que tinha que passar em casa e que me levava um pouco mais à frente. Aguardei no carro e passados cinco minutos aparece e convida-me a entrar para almoçar. Aí estava a sua família e fui muito bem recebido. Como eu gosto destes momentos, quando a chuva caía forte e eu não sabia o que iria fazer da minha vida, consigo uma boleia e um almoço … e melhor, fico a conhecer verdadeiramente como vivem as pessoas locais.
Estes momentos ficam no meu coração e não há dinheiro que os pague. Nesse dia consegui chegar pela noite à cidade mais próxima da eco aldeia, onde iria ficar uma semana. Montei a tenda no descampado e no dia seguinte tive que atravessar a cidade toda, as minhas costas já não aguentavam mais o peso da mochila!
Quando cheguei à aldeia, que estava escondida dentro de um bosque no meio da montanha a quase 100km da cidade, encontro esta situação: não havia água quente, frigorífico ou fogão, apenas meia dúzia de lâmpadas e uma tomada de electricidade. Escusado será dizer que televisão, computadores ou Wi-Fi eram produtos da nossa imaginação.
As habitações, que eram quatro, a cozinha comunitária e o templo eram de madeira com alguns acabamentos em adobe. Estava como na pré-história e curioso para saber como seriam os próximos dias. Acompanhem em Puririy.
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