Quando falamos em segredo profissional, dependendo da área de atuação, este pode estar relacionado com a atividade profissional propriamente dita ou com os clientes que utilizam produtos ou serviços dessas áreas de atividade. A quebra do sigilo profissional está regulado, normalmente, nos códigos deontológicos das mais diversas profissões e nos regulamentos internos das empresas.
Os códigos deontológicos são desenvolvidos pelas associações e ordens profissionais que, de acordo com lei nº 2/2013 de 10 de dezembro, além da representação e defesa dos interesses gerais da profissão, têm também como atribuições a regulação do acesso e do exercício da profissão e o exercício do poder disciplinar sobre os seus membros.
Ordem dos Médicos, Ordem dos Enfermeiros, Ordem dos Psicólogos, Ordem dos Advogados e Ordem dos Contabilistas Certificados são alguns exemplos de ordens profissionais.
O regulamento interno da empresa, caracterizado no artigo 99º do Código do Trabalho, é um “manual de instruções” sobre organização e disciplina no trabalho de uma empresa, onde devem estar referidos os deveres éticos e comuns a todos os profissionais, sem desrespeitar o que está regulamentado no Código do Trabalho.
No Código do Trabalho, artigo 128º sobre os deveres do trabalhador, está a seguinte alínea:
“Guardar lealdade ao empregador, nomeadamente não negociando por conta própria ou alheia em concorrência com ele, nem divulgando informações referentes à sua organização, métodos de produção ou negócios.”
No artigo 351º, ainda no Código do Trabalho, sobre a noção de justa causa de despedimento, a alínea e) constitui, entre outras, como justa causa:
“Lesão de interesses patrimoniais sérios da empresa.”
Agora que já sabemos os instrumentos que podem regular a atividade profissional, importa saber o que é o sigilo profissional e quais as consequências da quebra do sigilo profissional.
O que é o sigilo profissional?
O sigilo ou segredo profissional é a ação adotada pelo profissional de manter confidencial informações referentes a pessoas ou organizações que tenham sido adquiridas em função do exercício da sua profissão.
Como já dissemos, são várias as profissões que exigem o segredo como forma de garantir a confidencialidade e segurança das informações sigilosas trocadas entre as partes envolvidas.
A quebra do do sigilo profissional, ou seja, revelar estas informações a terceiros e sem a autorização dos donos da informação, pode gerar consequências e danos materiais.
As empresas procuram profissionais que não divulguem métodos ou estratégias a empresas concorrentes.
No caso dos médicos, enfermeiros, psicólogos, advogados, consultores, entre outros profissionais, a confidencialidade das informações é um direito do cliente e um dever do profissional.
Em relação ao jornalistas, a lei nº 1/99 de 01 de Janeiro, que aprova o Estatuto do Jornalista, no artigo 11º, confere proteção ao jornalista em matéria de sigilo profissional dizendo que:
“Sem prejuízo do disposto na lei processual penal, os jornalistas não são obrigados a revelar as suas fontes de informação, não sendo o seu silêncio passível de qualquer sanção, direta ou indireta.”
No entanto, se for ordenada a quebra do sigilo profissional pelas autoridades judiciárias, esta deverá ocorrer mediante condições específicas, nomeadamente a prestação de declarações sem público, “ficando os intervenientes no ato obrigados ao dever de segredo sobre os factos relatados”.
Resumindo, o sigilo profissional pode ter por finalidade respeitar e proteger o direito das pessoas/fontes/clientes à confidencialidade das suas informações e dados pessoais ou à proteção de informação e dados empresariais. A quebra deste segredo por parte dos profissionais implica consequências para esses trabalhadores.
Nota: as autoridades judiciais podem ordenar o levantamento do sigilo profissional se isso se verificar necessário em processos judiciais.
Saiba o que acontece se se verificar uma quebra do sigilo profissional
O sigilo profissional é, geralmente, regulado através de contrato individual de trabalho ou, se se aplicar, por via de contrato coletivo de trabalho. Também podem estar dispostas em documento interno da empresa, como seja, num regulamento. Sendo assim, as consequências da uma quebra de sigilo profissional podem ser, à luz da legislação laboral, encaradas da mesma forma do que qualquer outro aspeto vigente no contrato que é quebrado por uma das partes.
Quebra do sigilo profissional no âmbito de um contrato de trabalho
O dever de sigilo profissional é geralmente referido nas cláusulas do contrato de trabalho, e esse dever é bilateral: não só o trabalhador tem o dever de proteger informação confidencial em relação à empresa, como o empregador também deve proteger os empregados.
No caso de haver uma quebra do sigilo profissional por parte do trabalhador, este poderá ver desencadeada uma ação disciplinar interna, movida pela própria empresa, e em último caso pode originar um despedimento por justa causa.
A empresa pode também recorrer à queixa-crime, de que poderá resultar o trabalhador ser acusado de violação de segredo ou crime de aproveitamento indevido de segredo, ambos passíveis de resultar em pena de prisão ou multa.
Por sua vez, o trabalhador poderá apresentar queixa junto da autoridade para as condições do trabalho, e, posteriormente, este organismo irá orientá-lo no que toca aos procedimentos adequados a tomar.
Âmbito de aplicação
O sigilo profissional é muito usado em Portugal no universo dos negócios, da advocacia, da política, ou da medicina. Isto porque são áreas nas quais se lida quase todos os dias com situações muito delicadas, nomeadamente quando uma das partes envolvidas não quer que a outra parte divulgue, de maneira nenhuma, determinadas informações que pretende manter na base da total confidencialidade.
No caso da advocacia, o sigilo profissional é um dever. É um dos princípios básicos do que constitui exercer a profissão de advogado. Todas as informações trocadas entre o cliente e o seu advogado, médico, ou psicólogo, devem manter-se em sigilo profissional, sempre, e em absoluto.
Também no que diz respeito a situações de prevenção e repressão de crimes de branqueamento de capitais e financiamento de atos de terrorismo, a lei obriga os advogados, em certas circunstâncias, a deveres de identificação, colaboração e comunicação às autoridades competentes, que podem conduzir à revelação de informações transmitidas por clientes.
Dever de manter o sigilo
O profissional (advogado, médico, psicólogo, contabilistas etc.) é obrigado a manter o sigilo profissional, mesmo quando autorizado pelo cliente/constituinte a quebrá-lo. No entanto, em casos considerados como extremos, o pacto de sigilo pode ser quebrado.
No caso dos advogados, não basta que o cliente/constituinte autorize que os seus dados pessoais sejam revelados – é preciso uma autorização prévia por parte do Presidente do Conselho Regional, que garantirá a absoluta necessidade da desvinculação do segredo para a defesa da dignidade, direito e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes.
Quando numa relação profissional ou laboral estão em causa dados pessoais de grande importância, é fundamental que a confiança entre as parte seja mantida – é sobretudo por esta razão que a lei prevê a existência do sigilo profissional.
É importante referir que mesmo que o profissional deixe de exercer a atividade em questão, o dever de sigilo mantém-se.
Quebrar o segredo profissional sem qualquer razão validada pela lei pode resultar, por exemplo, na expulsão da ordem profissional respetiva, o que implica a impossibilidade de exercer essa atividade.
Exemplos de quebra de sigilo profissional
Em certas situações, a quebra do sigilo profissional não é uma opção, mas uma necessidade.
Um cliente confessa ao advogado que vai cometer um homicídio. Neste caso, considerado extremo, o advogado poderá quebrar o dever de manter sigilo profissional, e pedir autorização ao Presidente do Conselho Regional para divulgar o facto às autoridades competentes.
Um cliente informa o psicólogo de que vai cometer suicídio. O psicólogo vê-se na necessidade e até obrigação de comunicar à família do cliente a situação para que tome medidas preventivas. Também o psicólogo pode pedir para que o dever de sigilo profissional seja levantado, se em causa estiver a vida humana, do cliente ou de terceiros.
Neste aspeto, o Código Deontológico é claro, ao especificar que o sigilo profissional pode ser violado pelo profissional quando se verificar uma situação de perigo para o cliente ou para terceiros que possa ameaçar de uma forma grave a sua integridade física ou psíquica, nos quais se incluem perigo de vida, perigo de dano significativo, ou qualquer forma de maus-tratos a menores de idade ou adultos particularmente indefesos, em razão de idade, deficiência, doença ou outras condições de vulnerabilidade.
Devido ao carácter urgente e iminente deste tipo de situações, o psicólogo não tem necessariamente que estar dependente de autorização da Ordem dos Psicólogos, particularmente numa tentativa de suicídio iminente, muito comum nestes casos.
Na Igreja não há lugar para exceções
No que diz respeito aos padres da Igreja Católica, o teor das confissões por parte dos fiéis jamais pode ser revelado. O sigilo é absoluto e inviolável. O padre é obrigado a manter a confidencialidade sobre tudo o que lhe for transmitido durante as confissões dos fiéis. Isto porque o sigilo está consagrado no direito canónico.
Normalmente, se estiver perante uma situação de crime, o máximo que o padre pode fazer é tentar convencer a pessoa e entregar-se à autoridades por sua própria iniciativa.
Segundo a doutrina da Igreja, quebrar o sigilo significa violar a intimidade da pessoa, e assim cometer um ato de injustiça que, sobretudo, contradiz a religiosidade. Se um padre quebrar o sigilo, é excomungado, que no contexto da Igreja é uma pena gravíssima. Isto significa que é suspenso de realizar qualquer atividade relacionada com a Igreja.
Na saúde
Também a classe da saúde se vê frequentemente a braços com o dever de sigilo profissional, que faz parte do código deontológico do setor. Não só os médicos, mas também os enfermeiros e outros técnicos de saúde que têm acesso a dados sobre a saúde do paciente que são consideradas confidenciais.
Estes devem apenas partilhar a informação pertinente só com aqueles que estão implicados no plano terapêutico, usando como critérios orientadores o bem-estar, a segurança física, emocional e social do indivíduo e família, assim como os seus direitos.
Na verdade, os dados de saúde já se encontram protegidos em termos de direitos de uso: a lei de Proteção de Dados Pessoais protege todos os dados concedidos pelos pacientes desde o momento que dão entrada em qualquer unidade hospitalar, considerando-os como “dados sensíveis”. Mesmo para além da morte do paciente, estes direitos mantêm-se e não pode acontecer a quebra do sigilo profissional.