Quando o assunto é crédito, há sempre um termo que vem à baila e que é quase um tabu: o fiador. Ajudar um familiar ou amigo a conseguir aquele empréstimo de que tanto precisa pode parecer uma boa ação, mas pode ter um impacto negativo nos seus próprios projetos. Ser fiador impede o financiamento em muitas situações, por isso esteja atento.
Antes de mais, vamos contextualizar. Um fiador é alguém que dá ao banco garantias sobre o crédito concedido a outra pessoa, ou seja, assume os pagamentos das prestações se essa pessoa entrar em incumprimento.
Apresentar um fiador não é obrigatório, mas é exigido pelos bancos em muitas situações – nomeadamente aquelas em que o banco entende que há um risco elevado de incumprimento.
Para ser fiador de alguém não há grandes exigências: basta que tenha capacidade de assumir as prestações caso seja necessário. No entanto, aceitar ser fiador de alguém é uma decisão definitiva – não pode simplesmente deixar de ser fiador quando mudar de ideias ou quiser seguir com a sua vida sem aquele encargo a pesar-lhe.
Importa também saber que um fiador pode ser penhorado. A penhora acontece quando nem o devedor nem o fiador têm como pagar as prestações e o devedor não tem bens que possam ser penhorados. Na falta de mais garantias, o banco opta por penhorar o fiador para não ficar a perder no negócio.
Porque sentimos nós a necessidade de contextualizar o regime de fiança bancária? Porque estas características podem pesar-lhe quando for ao banco pedir um crédito para si. Resumindo: ser fiador impede o financiamento bancário com muita facilidade.
Como é que ser fiador impede o financiamento?
Ser fiador de alguém pode impedir o financiamento dos projetos próprios porque, quando for pedir um crédito, o banco vai pesquisar todos os seus encargos financeiros para avaliar a sua capacidade de devolver o que está a pedir emprestado.
Ora, nesta pesquisa de encargos vão ser considerados os seus contratos de fiança. Estes não entram na conta como “créditos”, mas como “créditos potenciais”, ou seja, encargos que não estão em vigor agora mas que podem vir a aplicar-se no futuro.
Estes registos estão no Banco de Portugal: cada português tem uma “ficha” no Banco de Portugal onde estão registados todos os créditos que contraiu, todos os que pagou e todos os que não conseguiu pagar sem entrar em incumprimento. No caso dos contratos de fiança, se o devedor entrar em incumprimento essa falha é registada em duas fichas: na dele e na do fiador.
Vamos ser mais específicos: já sabe que, quando tem historial de incumprimento no Banco de Portugal, os bancos vão ser mais reticentes a conceder-lhe um crédito. Ora, se o incumprimento da pessoa de quem foi fiador também fica registado na sua folha, percebe-se que qualquer banco tenha pouca vontade em emprestar-lhe dinheiro no futuro.
Na mesma lógica, mesmo que não tenha incumprimentos registados, ser fiador impede o financiamento se o crédito potencial – ou seja, o valor a pagar em caso de incumprimento do devedor original – for elevado.
O que é que significa na prática?
Vamos explicar com números para ser mais fácil: imagine que o seu salário é de mil euros e é fiador de um primo que tem uma mensalidade de 300 euros para pagar. O banco que concedeu o crédito ao seu primo vai aceitá-lo como fiador (porque o seu salário chega para cobrir a mensalidade), mas outro banco pode não querer emprestar-lhe dinheiro a si porque tem receio que o seu primo entre em incumprimento e acabe por ter de pagar dois empréstimos: os 300 euros do seu primo mais o seu próprio crédito.
Assim, apesar de não ser regra, ser fiador impede o financiamento dos próprios projetos em inúmeras situações. Convém, por isso, avaliar muito bem a sua situação financeira antes de aceitar assinar um contrato de fiança, mesmo que à primeira vista pareça uma coisa simples e os seus rendimentos cheguem para cobrir a despesa – ou até mesmo que confie muito na pessoa de quem está a ser fiador.
Lembre-se sempre que o contrato de fiança não pode ser revogado. Não vai nunca poder procurar um banco e pedir para deixar de ser fiador, porque o banco só vai aceitar se, em troca, receber outras garantias equivalentes. Além disso, só pode deixar de ser fiador se o devedor aceitar. Conclusão: assim que assina um contrato de fiança fica preso a ele até ao fim.
Se considerarmos que, na maioria das vezes, os contratos de fiança são feitos para créditos de grande volume – como créditos habitação -, estamos a falar de um compromisso que pode durar várias décadas durante as quais vai ter aquele “peso” a contar para todas as operações bancárias que fizer.
Outro ponto relevante é o da herança da fiança. Já que estamos a falar de contratos de fiança que vão “prendê-lo” por várias décadas, lembre-se que os seus herdeiros vão receber de si as propriedades, mas também as dívidas, ou seja, se morrer antes de o crédito de que foi fiador terminar, os seus herdeiros vão ter de assumir a responsabilidade dessa fiança – e, em consequência, também podem ver os seus financiamentos bloqueados por estarem potencialmente obrigados a pagar um crédito do qual nem sequer aceitaram ser fiadores.
Concluindo, ser fiador pode impedir o financiamento, sim, e de várias formas e em várias situações. Convém, por isso, avaliar bem o seu caso e pensar se vale mesmo a pena comprometer-se pelo crédito de outra pessoa.